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É possível um cuidado seguro para os pacientes

Publicada em: 17/03/2009
Por: Rafael Vinicius Fonseca da Silva

Pesquisadores da Fiocruz e do Ministério da Saúde assinam carta para promover a segurança no cuidado hospitalar O recente caso da paciente que morreu após uma cirurgia realizada provavelmente em local errado trouxe à discussão a triste realidade dos problemas de segurança aos quais os pacientes estão expostos nos serviços de saúde.

A preocupação com a qualidade do cuidado à saúde e a segurança do paciente é antiga e foi expressa na máxima atribuída a Hipócrates: “Primum non noscere” (Primeiro não causar dano). Considerando que, em algum momento da vida, as pessoas necessitam de assistência e se utilizam do sistema de saúde para receber cuidado, é relevante a crescente preocupação com a melhoria da qualidade. E, para que haja qualidade, é imprescindível que o sistema de cuidado seja seguro.

Desde a década de 1980, passaram a ser divulgados na mídia problemas relacionados à segurança do paciente, tais como: incidentes dramáticos de mortes evitáveis, decorrentes de procedimentos cirúrgicos e anestésicos, infecção hospitalar e outros problemas relacionados ao cuidado ao paciente.

As questões sobre a segurança do paciente são alvo de contínuo interesse, desde a divulgação, em 2000, do relatório “Errar é Humano” (“To Err is Human”), do Instituto de Medicina dos Estados Unidos. Os dados apresentados são alarmantes. Estimou-se que a cada ano cerca de 100 mil pessoas morrem nos hospitais dos EUA como resultado de erros relacionados ao cuidado de saúde que poderiam ser evitados. Além do sofrimento dos pacientes e de seus familiares, a ocorrência de erro nos serviços de saúde provoca grave prejuízo financeiro, pois a maior permanência dos pacientes no hospital representa um gasto de bilhões de dólares por ano. O título do relatório, “Errar é Humano”, chama a atenção para as limitações que são inerentes à atividade humana, mas não justifica a falta de ação frente às falhas nos processos de cuidado aos pacientes que podem ser prevenidas e cuja conseqüência é expressa por vidas perdidas, seqüelas e desperdício de recursos.

Vários estudos sobre a segurança dos pacientes têm como foco as falhas no sistema de cuidado, ou seja, falhas atribuídas à organização hospitalar. Se por um lado a tecnologia melhorou a capacidade do médico de realizar diagnósticos mais precisos e tratamentos mais efetivos, por outro não só a complexidade do sistema de saúde aumentou, como também, em geral, as condições de saúde dos pacientes hospitalizados são mais graves do que no passado. Falhas não intencionais ocorrem devido à natureza complexa do cuidado ao paciente, que envolve um grande número de intervenções e cujos aspectos nenhum profissional de saúde pode controlar. Esse contexto de risco requer que potenciais falhas sejam antecipadas e que procedimentos preventivos de riscos aos pacientes sejam implantados.

Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz, financiado pelo CNPq, analisou três hospitais no Rio de Janeiro e mostrou que, 8 (oito) em cada 100 pacientes internados sofrem um ou mais eventos adversos, freqüência semelhante àquela observada nos países desenvolvidos. Mas o mais grave é que 67% destes eventos poderiam ser evitados através de ações gerenciais conhecidas. Esse estudo mostrou que o número de dias adicionais de permanência no hospital em decorrência dos eventos adversos triplicou, que o local mais freqüente de ocorrência foi a enfermaria e que o procedimento cirúrgico foi a causa mais recorrente de evento adverso.

No mundo, a cada ano, são realizados cerca de 234 milhões de procedimentos cirúrgicos. As complicações cirúrgicas decorrentes de falhas são comuns e geralmente podem ser evitadas. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estabeleceu em 2004 a Aliança Mundial para a Segurança do Paciente (World Alliance for Patient Safety), que congrega os países membros das Nações Unidas, com o propósito de coordenar ações de abrangência internacional e concentrar esforços para o enfrentamento do problema. A Aliança tem proposto iniciativas para a promoção da segurança do paciente para serem implementadas pelas organizações dos próprios países, sob supervisão e apoio das regionais da OMS (http://www.who.int/patientsafety/en).

O Ministério da Saúde do Brasil aderiu à campanha: Cirurgia Segura Salva Vidas (Safe Surgery Saves Lives), cujo objetivo é melhorar a segurança do cuidado cirúrgico em todo o mundo, definindo padrões de segurança que podem ser aplicados em todos os países membros da OMS. O foco dessa iniciativa é a adoção nos hospitais de um checklist padronizado, preparado por especialistas para ajudar as equipes cirúrgicas a reduzirem as ocorrências de danos ao paciente. O checklist tem que ser realizado em TODAS as cirurgias e em todas as fases: antes do início da anestesia, antes da incisão na pele e antes do paciente sair da sala cirúrgica. Em cada fase, o coordenador do checklist deve confirmar se a equipe cirúrgica completou todas as tarefas previstas para aquela etapa, antes de prosseguir com a cirurgia.

Vários hospitais no mundo estão aplicando o checklist com resultado muito positivo para a segurança do paciente submetido a procedimentos cirúrgicos. Estudo recente em hospitais participantes da campanha Cirurgia Segura Salva Vidas da OMS demonstrou que, após a introdução da utilização do checklist, houve uma redução de 47% na taxa de mortalidade e de 36% na ocorrência de complicações pós-operatórias (New England Journal of Medicine, January 29, 2009).

O que falta para que medidas como esta façam parte do cotidiano dos hospitais brasileiros? É de fundamental importância que os profissionais e a sociedade estejam cada vez mais vigilantes para os potenciais riscos inerentes ao processo de cuidado, que estejam conscientes da seriedade dos problemas de segurança, e que ações, como o checklist da campanha Cirurgia Segura Salva Vidas, sejam implementadas nos hospitais brasileiros para que fatos, como cirurgias realizadas em local errado, deixem de ocorrer.

Claudia Travassos – pesquisadora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz
Adelia Quadros – pesquisadora do Ministério da Saúde
Mônica Martins – pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz
Walter Mendes - pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz

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