Home > Saiba mais > Material de AulaPublicado na Revista CIPA N. 253 de janeiro de 2002 BIOSSEGURANÇA: elo estratégico de SST Eng. Marco Antonio
F. da Costa, MSc - Fiocruz / EPSJV A princípio, o termo biossegurança, pode parecer algo de intruso nas ações ocupacionais de saúde e segurança no trabalho. Este fato é evidenciado em alguns currículos de cursos de pós-graduação, principalmente na área da engenharia de segurança do trabalho, onde este tema não tem sido contemplado. A nível de empresa, a SST, ainda é vista como uma obrigação legal, e não como elo estratégico do negócio, diferentemente da biossegurança, que pela sua abrangência, consegue "enxergar" a complexidade presente nos processos de trabalho, já que atua em seu contexto, atrelada as ações gerenciais de qualidade. O objetivo deste artigo, portanto, é o de colocar a biossegurança em um cenário tal de visibilidade, que permita aos demais profissionais que atuam com prevenção e controle de riscos ocupacionais, entenderem seus propósitos, suas contradições, e principalmente sua importância como instrumento de proteção da vida, em qualquer que seja o ambiente de trabalho, que é, inclusive, um dos principais objetivos da II Conferência Nacional de Saúde, realizada em Brasília, no período de 15 a 19 de dezembro de 2000. A ORIGEM DO CONCEITO - A lógica da construção do conceito de biossegurança, teve seu inicio na década de 70 na reunião de Asilomar na Califórnia, onde a comunidade científica iniciou a discussão sobre os impactos da engenharia genética na sociedade. Esta reunião, segundo Goldim (1997), "é um marco na história da ética aplicada a pesquisa, pois foi a primeira vez que se discutiu os aspectos de proteção aos pesquisadores e demais profissionais envolvidos nas áreas onde se realiza o projeto de pesquisa". A partir daí o termo biossegurança, vem, ao longo dos anos, sofrendo alterações. Na década de 70 o foco de atenção voltava-se para a saúde do trabalhador frente aos riscos biológicos no ambiente ocupacional. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (WHO, 1993) as "práticas preventivas para o trabalho em contenção a nível laboratorial, com agentes patogênicos para o homem". Já na década de 80, a própria OMS (WHO, 1993) incorporou a essa definição os chamados riscos periféricos presentes em ambientes laboratoriais que trabalhavam com agentes patogênicos para o homem, como os riscos químicos, físicos, radioativos e ergonômicos. Nos anos 90, verificamos que a definição de biossegurança sofre mudanças significativas. Em seminário
realizado no Instituto Pasteur em Paris (INSERM, 1991), observamos a
inclusão de temas como ética em pesquisa, meio ambiente,
animais e processos envolvendo tecnologia de DNA recombinante, em programas
de biossegurança. Uma definição centrada no ambiente ocupacional encontramos em Teixeira & Valle (1996), onde consta no prefácio "segurança no manejo de produtos e técnicas biológicas". Uma outra definição,
baseada na cultura da engenharia de segurança e da medicina do
trabalho é encontrada em Costa (1996), onde aparece "conjunto
de medidas técnicas, administrativas, educacionais, médicas
e psicológicas, empregadas para prevenir acidentes em ambientes
biotecnológicos". Está centrada na prevenção
de acidentes em ambientes ocupacionais. Estas definições mostram que a biossegurança envolve as seguintes relações:
AS BASES DE CONHECIMENTO DA BIOSSEGURANÇA - Em termos epistemológicos, o conceito de biossegurança pode ser definido, segundo a abordagem, como módulo, como processo ou como conduta (Costa, 1999, 2000a, 2000b). Como módulo, porque a biossegurança não possui identidade própria, não sendo portanto uma ciência, mas sim, uma interdisciplinaridade que se expressa nas matrizes curriculares dos seus cursos e programas. Esses conhecimentos diversos oferecem à biossegurança uma diversidade de opções pedagógicas, que a tornam extremamente atrativa. Como processo, porque
a biossegurança é uma ação educativa, e
como tal pode ser representada por um sistema ensino-aprendizagem. Nesse
sentido, podemos entendê-la como um processo de aquisição
de conteúdos e habilidades, com o objetivo de preservação
da saúde do Homem, das plantas dos animais e do meio ambiente.
Exatamente, a partir desse enfoque interdisciplinar, da sua atração curricular e do seu poder de mídia, a biossegurança passou a frequentar ambientes ocupacionais antes ocupados pela engenharia de segurança, medicina do trabalho, saúde do trabalhador e até mesmo da infecção hospitalar, atuando em forma conjunta, e, em muitos casos, incorporando e suplantando essas outras atividades. A BIOSSEGURANÇA LEGAL - A biossegurança no Brasil está formatada legalmente para os processos envolvendo organismos geneticamente modificados, de acordo com a Lei de Biossegurança - N. 8974 de 05 de Janeiro de 1995, que cita no seu art. 1o : "Esta Lei
estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização
no uso das técnicas de engenharia genética na construção,
cultivo, manipulação, transporte, comercialização,
consumo, liberação e descarte de organismo geneticamente
modificado (OGM), visando a proteger a vida e a saúde do homem,
dos animais e das plantas, bem como o meio ambiente". A PROFISSIONALIZAÇÃO DA BIOSSEGURANÇA - Diferentemente dos profissionais que atuam na segurança ocupacional, poderíamos apontar para o fato de que a biossegurança, ainda não atingiu um status profissional, como a engenharia de segurança do trabalho e da medicina do trabalho, que possuem campos muito bem delimitados de ação, cursos regulares, associações, regulamentação profissional (esses profissionais necessitam de registro nos Conselhos Regionais de Engenharia e Arquitetura e Conselhos Regionais de Medicina, respectivamente) e código de ética. A biossegurança pode ser entendida, hoje, como uma ocupação, agregada a qualquer atividade onde o risco à saúde humana esteja presente. Qualquer profissional pode desenvolver atividades nessa área, respeitando-se, logicamente, os espaços legais envolvidos. A grande vantagem dos profissionais que possuem cursos de biossegurança, é que o conteúdo desses cursos, abrange, de forma pedagogicamente articulada, temas das mais diversas áreas da saúde e segurança no trabalho, inclusive ambientais, tanto no contexto da biossegurança legal, quanto da praticada. Nos cursos regulares de biossegurança da Escola Nacional de Saúde Pública e da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, unidades de ensino da Fundação Oswaldo Cruz no Rio de Janeiro, já observamos o interesse de engenheiros de segurança, médicos do trabalho e técnicos de segurança do trabalho em realizarem esses cursos. A IMAGEM PÚBLICA DA BIOSSEGURANÇA - Quando analisamos a imagem pública da biossegurança (experiência docente em cursos realizados em laboratórios de saúde pública, hemocentros, hospitais, indústrias e universidades, em vários estados do Brasil), observamos que ela é percebida muito mais a nível de saúde do trabalhador e prevenção de acidentes, ou seja, muito mais voltada a segurança ocupacional frente aos riscos tradicionais, do que aqueles que envolvem tecnologia de DNA recombinante. Mesmo em cursos de biossegurança em engenharia genética o foco de interesse sempre volta-se para os processos e riscos tradicionais. A percepção da biossegurança atrelada a lei de Biossegurança, se dá mais a nível acadêmico e político e nos ambientes onde a moderna biotecnologia se faz presente, do que nos ambientes ocupacionais tradicionais, tanto a nível da indústria, quanto da área da saúde, foco maior de utilização do termo biossegurança. CONCLUSÃO - Nos últimos anos, o conhecimento científico aplicado às ações de gestão e controle de riscos ocupacionais vem evoluíndo de forma exponencial. Por outro lado, o processo normativo, através das normas ISO da série 9000 e 14000, e recentemente da OHSAS série 18000 (Organization for Health and Safety Assessment Series - normas certificáveis do British Standard Institut, referentes a saúde e segurança no trabalho), tem sido de fundamental importância, já que atuam como verdadeiros parceiros nos processos de segurança ocupacional. Aliado a este cenário, verificamos uma necessidade sentida de aperfeiçoamento constante dos profissionais que atuam nessa área, principalmente a nível dos engenheiros e técnicos de segurança do trabalho, que já estão sendo solicitados para exercerem suas atividades, em locais, até recentemente isentos desses profissionais, como por exemplo, os ambientes de saúde e da moderna biotecnologia. Isto nos leva a ver a biossegurança como uma ferramenta fundamental para que esses profissionais exerçam em toda a plenitude suas atividades, no sentido de que a promoção da saúde seja alcançada, não e apenas a nível ocupacional, mas também, a nível planetário. Isto, significa que as empresas devem repensar suas ações de SST, que na sua grande maioria, existe, para atender a uma legislação, que cada vez torna-se mais rígida, voltando o foco para os seus processos de trabalho e não somente para o controle de riscos, e nesse contexto, a biossegurança torna-se um elo de suma importância. Referências Bibliográficas Costa, M.A.F.
Biossegurança: segurança química básica
para ambientes biotecnológicos e hospitalares. São Paulo:
Ed. Santos, 1996. OBS.: Ao utilizar parte deste texto, por favor, não esqueça de citar a fonte. Além de ser uma ação ética, você também estará contribuindo para o fim da pirataria editorial.
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