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Fayga Ostrower: convergências e divergências na arte e na ciência

Atribuir à ciência valor artístico era, para a artista plástica e educadora Fayga Ostrower, um grande equívoco, uma vez que a representação da natureza carece de experiência humana, de sentimentos e de expressividade, fatores essenciais à obra de arte.

Apesar dessa posição, Fayga foi uma grande pensadora sobre as interrelações entre ciência e arte, um tema que julgava fascinante e ao qual dedicou o quinto e penúltimo livro de sua vida: A sensibilidade do intelecto: visões paralelas de espaço e tempo na arte e na ciência. O livro rendeu à Fayga o Prêmio Literário Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, em 1999.

No livro, Fayga procura mostrar como as correspondências entre os pensamentos artísticos e científicos são evidentes e significativas, tanto em relação às perguntas feitas sobre a vida e o mundo, quanto às respostas encontradas e manifestadas por elas em determinados momentos históricos.

A artista destaca três momentos de convergência entre a ciência e a arte: o Renascimento, a Revolução Francesa e o início do século 20. Para ela, era natural e até mesmo lógico que as novas formas de pensamento surgidas nesses períodos de grande ruptura na esfera cultural tivessem impacto tanto nas manifestações artísticas quanto no campo científico. 

Se, por um lado, a arte e a ciência apresentam momentos de convergência ao longo da história, para Fayga, as divergências são claras quanto a seus objetivos, métodos e formas de funcionamento. Em A sensibilidade do intelecto, ela analisa essas diferenças na prática de cada uma das atividades.

A ciência, de um lado, busca a verdade universal. Nessa busca, adota um método bem particular: ao observar os fenômenos naturais, o cientista formula hipóteses; estas devem ser testadas em condições experimentais para que sejam validadas e se tornem modelos teóricos aceitos no meio científico.

Já a arte, afirma Fayga, não busca a verdade absoluta, e sim a verdade concreta de cada configuração, definida e articulada pelo artista. Para encontrar a sua verdade, o artista parte de sua própria experiência de vida. No caminho, conduzido pela intuição e razão, por suas vivências e valores, vai acrescentando novos elementos à composição. Ao final, tem à sua frente uma imagem que consiste na última de muitas sínteses anteriores. E, por mais que tente repetir essa composição, seguindo passo a passo as etapas de sua elaboração, nunca poderá obter o mesmo resultado.

Independentemente das convergências e das divergências entre arte e ciência enumeradas por Fayga, ela frisa com especial atenção um aspecto que se manifesta de forma idêntica nessas duas vias de conhecimento: os momentos decisivos de criação.

"A criatividade, como potencial, e a criação, como realização do potencial, se manifestam de modo idêntico, independentemente dos rumos específicos que depois seguirão nas duas grandes vias do conhecimento", afirma Fayga (Ostrower, 1998, p. 285). Para ela, o momento criativo, tanto na arte como na ciência, é marcado pela mistura de razão e intuição, de medidas friamente calculadas e acasos.

Por mais que envolvam hipóteses, estimativas, comparações e deduções, esses momentos não podem ser considerados puramente racionais. E, por mais que sejam momentos de revelação, espasmos, de insight, não podem ser considerados totalmente inconscientes e abstratos. "São momentos de 'compreensão intuitiva' iluminados por um súbito saber, uma súbita certeza", explica a artista (Ostrower, 1998, p. 285).

Mini-biografia
Fayga Perla Krakowski nasceu em 14 de setembro de 1920 na cidade de Lodz, na Polônia, se mudou para o Brasil com a família em 1924 e faleceu em 13 de setembro de 2001, no Rio de Janeiro. Teve papel fundamental no campo da arte e no pensamento intelectual brasileiro. Entre 1948 e 2001, expôs suas obras em diversos museus brasileiros e estrangeiros. Lecionou durante 16 anos no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, ministrou cursos nas principais instituições artísticas do país e proferiu palestras – para estudantes, artistas, operários e empresários – por todo o mundo, com carisma, didatismo e clareza. Ela se destacou ainda como uma importante pensadora sobre arte e ciência no país.

Fontes:

ALMEIDA, Carla. Fayga Ostrower, uma vida aberta à sensibilidade e ao intelecto. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 0, p. 269-289, out. 2006. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59702006000500017&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt

OSTROWER, Fayga. A sensibilidade do intelecto: visões paralelas de espaço e tempo na arte e na ciência. Rio de Janeiro: Campus, 1998.


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