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Fundação Oswaldo Cruz

A carne

Escrito em 1888 pelo naturalista Julio Ribeiro, a obra relata o romance entre Lenita e Barbosa, ambos com vasta formação intelectual sobre diversos assuntos científicos. Ambienta-se em uma fazenda, ainda em pleno regime escravista, no interior da província de São Paulo.

Na trama, há uma forte tensão entre os desejos carnais e o comportamento moral. Esse conflito perpassa todo o livro, onde há uma tentativa de colocar o saber acima dos desejos e das emoções. Aqueles que detêm o conhecimento são vistos como seres superiores, cujas ações são sempre guiadas pelo conhecimento adquirido, pela intelectualidade e não pelas "fragilidades fisiológicas".

O romance enfoca a contradição entre o agir de acordo com uma racionalidade adquirida e as necessidades fisiológicas humanas. Além de enfocar a sexualidade humana, principalmente a feminina, o romance trata também de assuntos polêmicos para o final do século 19, tais como o divórcio, a intelectualidade feminina, o papel da mulher na sociedade e os estereótipos sociais e culturais acerca do amor e do sexo.

A consistente formação científica de Lenita e Barbosa é o principal fator de aproximação do casal. No desenrolar do romance, várias experiências e explicações científicas sobre fenômenos da natureza estão presentes, dentre elas a montagem de um laboratório de "física eletrológica", onde são desenvolvidas experiências sobre eletricidade. Tais experiências e os instrumentos representam um outro mundo, até então desconhecido para os que viviam na fazenda e não tinham acesso a uma formação científica. Os passeios e excursões campestres, assim como as viagens, serviam de cenário para explicações científicas sobre espécimes vegetais e animais, relevo e clima da região visitada.

O conhecimento científico também é descrito a partir das práticas de tratamento e cura realizadas por Barbosa. Essas práticas eram feitas à luz das explicações racionais da ciência, adquiridas com anos de dedicação e estudo sobre a fisiologia humana e sobre o conhecimento de experimentos realizados por nobres cientistas. Enfermidades provocadas por efeitos nocivos de determinadas substâncias, anatomia e fisiologia são detalhadamente descritos. Questões sobre magia também aparecem no romance, e aquilo que era entendido como feitiçaria é desvendado pelas explicações científicas.

No romance, a ciência é, para os personagens, um procedimento fundamental perante a vida. Assim, a formação científica é entendida como essencial na formação do caráter e da personalidade. Isso exige que o comportamento moral de Lenita e Barbosa seja guiado pela racionalidade dos procedimentos científicos e não pelos desejos, o que provoca forte e constante tensão em todo o romance.

Fonte:

http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/biografias/autores/julio_ribeiro


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