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Fundação Oswaldo Cruz

Os periódicos de ciência no Brasil do século 19

A vinda da corte portuguesa para o Brasil, no início do século 19, propiciou a circulação de informação na colônia, especialmente após a criação da Imprensa Régia, em 1810. Nessa época, textos voltados à educação científica começavam a ser difundidos, muitos deles por meio de periódicos.

A divulgação de temas relacionados à ciência era pouco expressiva, embora o periódico O Patriota (1813-1814) enfatizasse a difusão da cultura científica no meio brasileiro com um de seus objetivos. Por esse propósito, tal periódico foi o mais importante propagador, na época, dos fatos científicos em terras brasileiras. Embora tenha tido vida curta, foram muitos os artigos que tinham relação com a ciência e a técnica publicados em seus dois anos de existência.

Mais dois periódicos importantes surgiram nessa época: A Gazeta do Rio de Janeiro (1808-1821) e Idade d’Ouro do Brasil (1811-1823), este último publicado na Bahia. Ambos dedicaram atenção a temas científicos, embora com intensidade menor. Surgiram também  O Correio Braziliense e O Investigador Português, que auxiliaram em alguma medida na divulgação de assuntos científicos na nova sede da corte. Nessa época, observa-se a praxe de copiar artigos oriundos de periódicos europeus.

Conheça:

           As características gerais dos periódicos do século 19

           A química nos periódicos 

           Periódicos do período regencial

           Publicações do segundo Império


Características gerais

Boa parte das publicações que circularam na primeira metade do século 19 tem como característica principal o pragmatismo científico. A maioria tratava de assuntos ligados à agricultura, indústria e mineralogia, além de abordar a área médica ou farmacêutica.

Mas, ao longo de todo o século 19, os temas científicos abordados nos periódicos eram quase todas as ciências estudadas na época: agronomia, astronomia, botânica, demografia, educação, física, geografia, história natural, medicina, meteorologia, mineralogia, química, sismologia, urbanismo e zoologia. (
Leia aqui mais detalhes sobre as seções de química publicadas em periódicos.) A maior parte dos artigos voltava-se a conhecimentos que pudessem ser importantes para o país, no sentido de gerar uma produção nacional e reduzir as importações.

O periódicos possuíam, em geral, entre quatro e 12 folhas, com páginas divididas em duas ou três colunas, e numeração contínua. Predominava o formato de 21,5 cm de largura por 12,5 cm. Utilizavam poucas ilustrações, por questões de custo, e faziam uso freqüente de pseudônimos nos textos publicados. Uma singularidade dessas publicações é o caráter de solidariedade preservado entre elas e o apoio mútuo para seu florescimento. Os principais periódicos reproduziam informações uns dos outros e reportavam a existência de novas publicações, registrando seu lançamento.

Há uma grande dificuldade, ou mesmo impossibilidade, de se precisar a tiragem da maioria dos periódicos dessa época. Sua distribuição se dava normalmente por meio de assinatura, com o custo médio de 10 mil réis por ano. Como estratégia de venda, os jornais enviavam para um grupo de pessoas o primeiro número, se este não fosse devolvido em determinado prazo, o destinatário passava a ser considerado assinante – como ocorre com alguns produtos atualmente.

Em uma sociedade praticamente analfabeta, era necessário estimular o uso de uma linguagem que pudesse ser lida e ouvida e, para isso, o jornalismo assumiu fins pedagógico-políticos, a pretexto de esclarecer a opinião pública. Ao longo do primeiro Império, entre 1822 e 1831, esse caráter sobretudo pedagógico era refletido em periódicos como Sabatina Familiar dos Amigos do Bem-Comum; Anais Fluminenses de Ciências, Artes e Literatura; Jornal científico, econômico e literário, relações, viagens, poesias e anedotas, misto de instrução e recreio acomodado a todos os gêneros de leitores; e O propagador das ciências médicas.

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Período regencial

No período Regencial (1831-1840), por conta das lutas entre liberais, conservadores e os que desejavam a volta de D. Pedro I ao Brasil, as publicações desse período dedicavam espaço expressivo às questões políticas, e proliferavam os irreverentes pasquins.

Nesse período foram criadas as primeiras sociedades técnico-científicas. Uma delas era a Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional, dedicada ao desenvolvimento da agricultura no Brasil. A entidade publicou um dos jornais mais duradouros da época – o
Auxiliador da Indústria Nacional.

Destacaram-se ainda os periódicos Semanário de Saúde Pública; Diário da Saúde, das Ciências Médicas e Naturais do Brasil; e Revista Médica Fluminense.

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Segundo Império

Com o início do segundo Império, em 1840, os brasileiros começaram a despertar do período de crise econômica e política que caracterizou o Primeiro Reinado e a Regência, voltando-se à inclinação pragmática já observada no fim do século 18, que se exprimia no culto às ciências e aos conhecimentos úteis.

Além disso, também contribuíram para o desenvolvimento da imprensa no país a ampliação da publicidade e a ligação entre o Brasil e a Europa pelo cabo submarino, pois assim as notícias chegavam mais rapidamente. Observa-se, assim, um aumento significativo no número de publicações e também de estabelecimentos tipográficos. Em 1876 surgiram os primeiros jornaleiros, os carros que vendiam jornal, e as bancas.

Uma curiosidade observada nesse período são as revistas produzidas no Brasil e publicadas em francês – língua estudada pela maioria da população mais abastada. Entre essas publicações figuravam a Revue française, litterature, sciences, beaux-arts, politique, commerce (1839-1840) e a L’Alcyon, litterature, sciences, arts, théâtres (1841).

Entre os periódicos com maior espaço dedicado à cobertura de ciência nesse período despontam a
Revista Médica Brasileira, Anais de Medicina Brasiliense, Minerva Brasiliense e Guanabara, revista mensal artística, científica e literária. Este último deu lugar, em 1857, à Revista Brazileira - Jornal de Sciencias, Letras e Artes. Na mudança, a publicação passou a ser trimestral e a ser dirigida por Candido Baptista de Oliveira. A Revista Brazileira publicava tanto textos elaborados pela própria equipe, como transcrições de artigos extraídos de publicações nacionais e estrangeiras. De maneira geral é possível observar um número significativo de matérias de divulgação científica.

A partir de 1850, as atividades de divulgação se intensificaram em todo o mundo, acompanhando as esperanças sociais crescentes acerca do papel da ciência e da tecnologia, que se intensificaram com a segunda revolução industrial na Europa. O Brasil, ainda que em menor escala, também foi atingido por essa onda de interesse pela divulgação científica.

Outras publicações da época são a Revista do Rio de Janeiro, lançada em 1876, cujo editor era Serafim José Alves, e a Revista do Observatório, que circulou entre 1886 e 1891. Esta última era editada mensalmente pelo Imperial Observatório do Rio de Janeiro (hoje, Observatório Nacional), e tinha uma comissão de redação formada por cientistas de destaque: Luis Cruls, Luiz da Rocha Miranda, Henrique Morize, J.E. de Lima.

Embora existisse nessa época uma preocupação em se divulgar ciência, com a circulação de um número grande de publicações, nota-se que o público que tinha de fato acesso a essa informação era bastante restrito. Segundo dados do primeiro censo demográfico, realizado ainda no tempo do Império, em 1872, 66,4% da população era analfabeta: 99,9% eram escravos, 80% homens livres e 86% mulheres. Na zona urbana do Rio de Janeiro, 230 mil habitantes não sabiam ler. 16,85% da população entre seis e 15 anos estava na escola, e 8 mil habitantes possuíam instrução superior.

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Fontes:

MASSARANI, Luisa. A divulgação científica no Rio de Janeiro: Algumas reflexões sobre a década de 20. Rio de Janeiro: IBICT e UFRJ, 1998. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Instituto Brasileiro de Informação em C&T e Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1998.

OLIVEIRA, José Carlos de. “As ciências no paço de D. João...”. História, Ciências, Saúde – Manguinhos, Rio de Janeiro, vol.6, n.1, , Mar/Jun. 1999. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-59701999000200009&lng=en&nrm=iso&tlng=pt>. Acesos em 13 abr. 2009.

OLIVEIRA, José Carlos de. Palestra proferida na Fiocruz. Rio de Janeiro, 14 ago. 2007.

SAMPAIO, Nadja Paraense. Palestra proferida na Fiocruz. Rio de Janeiro, 14 ago. 2007.

SANTOS, Nadja P e ALENCASTRO, R Bicca de: Pinto, Ângelo da C. “Jornais científicos brasileiros do século XIX (1813-1889) - Publicações na área da química”. Química Nova. (Submetido)


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