Descobertas e pesquisas recentes sobre o tema movimentaram a abertura do ano acadêmico de 2016. Atividade marcou a retomada de atividades do Centro de Estudos
Diante das constantes descobertas feitas pela comunidade científica mundial em torno do vírus Zika, o Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), que desenvolve estudos sobre o tema em diversas abordagens, promoveu o painel ‘Zika: do diagnóstico às lesões neurológicas’. O encontro, que marcou a abertura do ano acadêmico e o início das atividades do Centro de Estudos do IOC, recebeu os pesquisadores Marco Krieger, vice-diretor de Desenvolvimento Tecnológico e Prototipagem da Fiocruz-Paraná; Tania Saad, do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz); e Osvaldo Nascimento, da Universidade Federal Fluminense (UFF), que abordaram diferentes aspectos sobre o tema. O debate, realizado na última sexta-feira (11/03), foi mediado por Wilson Savino, diretor do IOC, e Myrna Bonaldo, chefe do Laboratório de Biologia Molecular de Flavivírus do Instituto. A mesa de abertura contou com a presença do Presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha; da vice-presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz, Nísia Trindade Lima; e da doutoranda em Medicina Tropical do IOC e representante discente, Maria Fantinatti.
Gutemberg Brito |
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O compromisso do IOC e da Fiocruz com o avanço das pesquisas sobre o vírus Zika diante da emergência em saúde pública de importância nacional e internacional foi ressaltado na abertura do ano acadêmico |
Gutemberg Brito |
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A aula inaugural reuniu pesquisadores e estudantes interessados no vírus Zika que ainda caracteriza um desafio para a comunidade científica global |
Para dar início às discussões, Myrna apresentou as características básicas do vírus Zika, um flavivírus da família Flaviviridae identificado pela primeira vez em 1947, em Uganda, na África. Segundo a virologista, até 2007, o vírus estava restrito à África e à Ásia, vindo a causar epidemias entre 2013 e 2014 na Polinésia Francesa, Nova Caledônia, Ilhas Cook e Ilhas da Páscoa, na Oceania. Myrna lembrou que o primeiro caso autóctone nas Américas foi relatado em maio de 2015, no Brasil, quando a zika foi considerada uma doença branda e com cerca de 75% de casos assintomáticos. Ainda segundo a pesquisadora, o alerta para o perigo do vírus surgiu devido ao aumento de casos de malformações congênitas e complicações neurológicas em adultos, em novembro de 2015. Recentemente, Myrna liderou um estudo que constatou a presença do vírus Zika ativo (com potencial de provocar a infecção) em amostras de saliva e de urina. A evidência inédita sugere a necessidade de investigação da relevância destas potenciais vias alternativas de transmissão do vírus Zika. “Ainda temos muitos desafios neste cenário, como o estabelecimento dos mecanismos de transmissão, o entendimento da biologia do vírus, o desenvolvimento de métodos diagnósticos, terapêuticos e preventivos e de políticas públicas de suporte às gestantes, às mães e crianças com microcefalia e aos indivíduos afetados pela Síndrome de Guillain-Barré”, concluiu.
Vírus Zika, microcefalia e as consequências para o desenvolvimento neuropsicomotor são alguns dos temas que têm dominado a rotina de Tania, especialista em neurologia infantil. A pesquisadora do IFF destacou as implicações do vírus Zika sobre o desenvolvimento fetal. “A infecção em grávidas tem causado efeitos devastadores que vão do aborto à gestação de fetos com malformações, como alterações na formação do tubo neural, do córtex e na migração neuronal, por exemplo”, explicou. Tomografia, ressonância, eletroencefalograma, dentre outros exames neurológicos, são necessários para compreender o modo como a microcefalia tem acometido crianças, apontou Tania. “Quando uma criança nasce, o sistema nervoso ainda está em fase de desenvolvimento – estes exames permitem dimensionar consequências de uma infecção que incluem déficits na memória, afetividade e comportamento social, e dificuldades de aprendizagem”, explicou Tania, ressaltando o acompanhamento pós-natal de mães e crianças como fundamental nos primeiros anos de vida. Atualmente, o IFF atua como uma ponte entre as pesquisas desenvolvidas sobre o vírus Zika, os estudos sobre microcefalia e o atendimento prestado às gestantes e crianças. “Buscamos acolher as mães para que elas se sintam seguras neste momento. Até mesmo diante das incertezas é preciso lidar da forma mais transparente possível”, concluiu Tania.
Gutemberg Brito |
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Marco Krieger, Tania Saad e Osvaldo Nascimento discutiram a importância do diagnóstico preciso da infecção, os impactos das malformações em fetos e os efeitos do vírus Zika para o organismo |
Além de avanços no conhecimento científico, o enfrentamento do vírus Zika depende do desenvolvimento tecnológico. O tema foi abordado por Krieger, um dos responsáveis pelo projeto do Kit NAT Discriminatório para Dengue, Zika e Chikungunya. Idealizado pelo IOC, o teste foi desenvolvido em parceria com o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), a Fiocruz-Paraná, o Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães (Fiocruz-Pernambuco) e o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz). O método permite a identificação simultânea do material genético dos três vírus, o que evita a necessidade de processamento de três exames separados para realizar o diagnóstico diferencial entre as infecções. De acordo com Krieger, a experiência na fabricação do kit NAT brasileiro para detecção de HIV e HCV em bancos de sangue permitiu desenvolver rapidamente um produto com alto padrão de qualidade. “Aproveitamos nossa competência tecnológica e capacidade de produzir em ‘boas práticas de fabricação’ para desenvolver um método que permite testar, em uma única placa, amostras de 30 pacientes para as três doenças. Uma vez que, em cada lote, avaliamos a qualidade dos insumos individualmente e de forma combinada, podemos garantir o desempenho do teste em qualquer laboratório”, comentou o pesquisador.
Registrado em nove países segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o aumento de casos da Síndrome de Guillain-Barré acarreta desafios científicos e de saúde pública na opinião de Nascimento, neurologista que acompanha pacientes internados no Hospital Antônio Pedro, da UFF. Segundo ele, foi observado um aumento de 18% nos casos da doença no Brasil de 2014 para 2015. Marcada por alterações de sensibilidade e fraqueza muscular, a enfermidade pode evoluir para quadros graves, com prejuízo da função respiratória e necessidade de internação em unidades de terapia intensiva. Além disso, nos casos em que o tratamento com imunoglobulina é necessário, o custo da terapia pode chegar a R$ 30 mil em cinco dias. Segundo Osvaldo, uma vez que a doença pode regredir espontaneamente, a avaliação clínica adequada é fundamental para verificar a necessidade do medicamento e da internação dos pacientes. “O quadro pode se estabelecer rapidamente, em um prazo de 24 horas a 72 horas. Portanto, o tratamento deve ser iniciado com base nos achados clínicos, mas é preciso fazer uma avaliação da escala de capacidade do paciente para estabelecer a terapia adequada”, explicou o neurologista. Nascimento acrescentou ainda que novas pesquisas são importantes para investigar os fatores envolvidos na manifestação da síndrome de Guillain-Barré associada ao vírus Zika. “Mesmo com o aumento de casos registrado, essa é uma doença rara. E por que apenas poucas pessoas desenvolvem a síndrome de Guillain-Barré? Provavelmente, isso está ligado a características imunológicas, que são determinadas geneticamente. Esses fatores imunogenéticos, envolvidos em uma reação exacerbada contra o vírus Zika precisam ser estudados”, disse o pesquisador, acrescentando que a UFF e o IOC já firmaram uma parceria para realizar pesquisas nesta linha.
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