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Publicado artigo que comprova efeito do sofosbuvir na infecção por febre amarela

Em testes com camundongos, medicamento usado no tratamento da hepatite C inibiu replicação do vírus, reduziu mortalidade e danos ao fígado

Um estudo inédito liderado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) demonstrou a ação do sofosbuvir – remédio usado no tratamento da hepatite C – em infecções por febre amarela: além de inibir a replicação viral, o tratamento preventivo reduziu significativamente a mortalidade e impediu os danos ao fígado em camundongos, considerados modelo para estudo da doença. Quando iniciada tardiamente, a terapia diminuiu as lesões hepáticas. Os dados foram publicados no dia 30 de janeiro na revista científica ‘Plos Neglected Infectious Diseases’. A atuação do sofosbuvir já foi atestada de forma pioneira pelo mesmo grupo de pesquisadores contra os vírus Zika, em 2016, e chikungunya, em 2018.

Coordenador do estudo, o pesquisador Thiago Moreno Lopes e Souza, do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/Fiocruz), destaca que a ação do sofosbuvir foi observada tanto sobre uma cepa viral isolada de um paciente com febre amarela quanto sobre a linhagem atenuada do vírus, que é utilizada na vacinação. “Os dados indicam que o sofosbuvir pode vir a ser uma alternativa tanto para indivíduos com infecção aguda, como para aqueles com complicações provocadas pela replicação do vírus vacinal. Além disso, uma vez que a imunização não é recomendada para as pessoas com maior risco de eventos adversos graves, incluindo idosos e indivíduos com imunodeficiências, a terapia poderia ser usada profilaticamente em casos específicos”, afirma Souza.

Imagens: de Freitas CS, et al. (2019) / Arte: Jefferson Mendes

Imagens de microscopia mostram recuperação do fígado de camundongos infectados pelo vírus da febre amarela após tratamento com sofosbuvir. Setas brancas apontam células inflamatórias e setas pretas destacam sinais de necrose no tecido hepático

Considerando a relevância de compartilhar rapidamente os resultados da pesquisa, o trabalho foi publicado de forma pioneira em fevereiro de 2018 no site de pré-print Biorxiv – plataforma que divulga estudos antes do processo de submissão às revistas científicas. “Esses achados são especialmente importantes uma vez que o sofosbuvir é um medicamento seguro, aprovado para uso no tratamento da hepatite C, e não há terapias específicas disponíveis para a febre amarela”, pontua a pesquisadora Patrícia Bozza, chefe do Laboratório de Imunofarmacologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), autora do estudo.

Ainda no ano passado, a ausência de tratamento levou ao início de testes com o sofosbuvir em pacientes com quadros graves durante o surto da doença. “Houve a apropriação dos resultados pela comunidade médica por meio do uso compassivo do fármaco, que ocorre quando um medicamento é receitado para uma finalidade diferente daquela que foi aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Porém, a partir das análises em cultura de células e em modelo experimental, é importante que ocorram investimentos em pesquisas clínicas para validar o tratamento”, afirma o pesquisador Fernando Bozza, chefe do Laboratório de Pesquisa Clínica em Medicina Intensiva do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), autor do artigo.

Eficácia e baixa toxicidade
Nos últimos anos, a ação do sofosbuvir foi demonstrada para diferentes microrganismos da família Flaviviridae, incluindo, além do vírus da hepatite C, Zika, dengue e, agora, febre amarela. Segundo os pesquisadores, isso ocorre porque os patógenos apresentam semelhanças na estrutura da enzima RNA polimerase, que atua na replicação do genoma viral e está no alvo da ação do sofosbuvir. “Na primeira etapa da pesquisa, foram realizadas análises em computador, que confirmaram a similaridade em regiões-chave da RNA polimerase do vírus da febre amarela com os vírus Zika e dengue. A modelagem computacional também apontou o bom potencial de interação do sofosbuvir com a molécula”, explica Thiago.

Considerando que o fígado é o órgão mais afetado pela infecção, duas linhagens de células hepáticas foram utilizadas nos testes seguintes. O medicamento inibiu a replicação viral nas culturas de células, com potência maior do que a ribavirina, um antiviral de amplo espectro usado como controle em pesquisas. A ação foi observada tanto sobre o vírus selvagem quanto sobre a linhagem atenuada, presente na vacina. O ensaio também confirmou a baixa toxicidade do fármaco: 25% menos tóxico do que a ribavirina, o sofosbuvir foi oito a nove vezes mais ativo sobre os vírus do que sobre as células hepáticas.

Como as duas linhagens virais foram suscetíveis ao sofosbuvir, os testes em camundongos foram realizados com o vírus vacinal, que apresenta menor grau de risco em biossegurança. O tratamento preventivo, iniciado um dia antes da infecção, reduziu significativamente a mortalidade da doença: diante de uma carga viral letal, 70% dos animais tratados sobreviveram. A terapia também impediu os danos ao fígado causados pelo agravo. O estudo apontou ainda benefícios no tratamento tardio. O uso do sofosbuvir iniciado um dia após a infecção melhorou a função hepática dos animais, embora não tenha alterado a mortalidade.

Potencial para reposicionamento
Os autores destacam que a pesquisa demonstra, pela primeira vez, a atividade do sofosbuvir contra o vírus da febre amarela. No entanto, ressaltam que apenas os ensaios clínicos poderão validar o uso da terapia em pacientes e apontar com precisão o período adequado para o tratamento. “Embora o pré-tratamento tenha se mostrado melhor para aumentar a sobrevida, a terapia tardia reverteu parcialmente as lesões hepáticas observadas nos animais. Esses dados reforçam o potencial de reposicionamento do sofosbuvir”, declara Thiago.

O estudo contou com a cooperação de quatro unidades da Fiocruz: CDTS, Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz) e Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz). Também colaboraram Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A pesquisa foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Fiocruz.

Reportagem: Maíra Menezes
Edição: Vinicius Ferreira e Raquel Aguiar
19/02/2019
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)

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