Publicada em: 28/03/2008 às 14:23
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Dengue: prevenção deve priorizar a eliminação de focos do Aedes aegypti
Jornalismo

Com o objetivo de esclarecer a população sobre o Aedes aegypti, vetor do vírus da dengue, o Instituto Oswaldo Cruz (IOC) disponibiliza as respostas de seus pesquisadores às perguntas mais freqüentes sobre o inseto transmissor. As questões abordam temas como a origem do mosquito, seus hábitos e seu ciclo de vida, esclarecendo dúvidas relativas a possíveis criadouros, supostas mudanças de hábitos, e sua recente multiplicação na cidade do Rio de Janeiro.

Por que o nome Aedes aegypti?
O mosquito Aedes aegypti é originário do Egito, mas se espalhou pelo mundo através da África: primeiro da costa leste do continente para as Américas, depois da costa oeste para a Ásia. O vetor foi descrito cientificamente pela primeira vez em 1762, quando foi denominado Culex aegypti.

 Genilton Vieira/IOC

 

 O mosquito A. aegypti se espalhou pelo mundo a partir da África, chegou a ser erradicado no Brasil, mas foi reintroduzido na década de 1960

É verdade que o mosquito Aedes aegypti já foi erradicado e depois reintroduzido no Brasil?
No início do século 20, o Aedes aegypti foi responsável pela transmissão da febre amarela urbana, o que impulsionou a criação de medidas para sua erradicação, que resultaram na eliminação do mosquito em 1955. No entanto, a erradicação não recobriu a totalidade do continente americano e o vetor permaneceu em áreas como Venezuela, sul dos Estados Unidos, Guianas e Suriname, além de toda a extensão insular que engloba Caribe e Cuba. A hipótese mais provável é de que tenha acontecido a chamada dispersão passiva dos vetores, através de deslocamentos humanos marítimos ou terrestres. No Brasil, o relaxamento das medidas de controle após a erradicação do vetor permitiu sua reintrodução no país no final da década de 1960. Hoje o mosquito é encontrado em todos os Estados brasileiros.

Como o Aedes aegypti chegou ao Brasil? Há registro histórico de dengue no passado?
As teorias mais aceitas indicam que o Aedes aegypti tenha se disseminado da África para o continente americano por embarcações que aportaram no Brasil para o tráfico de escravos. Há registro da ocorrência da doença em Curitiba (PR) no final do século 19 e em Niterói (RJ) no início do século 20.

 Genilton Vieira/IOC

 

 Mais comum em áreas urbanas, o mosquito transmissor da dengue vive perto do homem e pica sobretudo ao amanhecer e ao entardecer

A dengue ocorre só no Brasil?
Não. Há registro da doença em diversos países das Américas, bem como na África, na Ásia e na Polinésia Pacífica.

Que fatores influenciam a infestação pelo Aedes aegypti?
O Aedes aegypti é um mosquito antropofílico, isto é, ele vive perto do homem. Por isso, sua presença é mais comum em áreas urbanas e a infestação é mais intensa em regiões com alta densidade populacional e, principalmente, de desocupação desordenada, onde as fêmeas têm mais oportunidades para alimentação e dispõem de mais locais para desovar. A infestação por Aedes aegypti é sempre mais intensa no verão, em função da elevação da temperatura e da intensificação de chuvas – fatores que propiciam a reprodução do mosquito. Para evitar esta situação, é preciso desenvolver medidas permanentes para o controle do mosquito, durante todo o ano, a partir de ações preventivas que objetivem a eliminação de focos do vetor. Essa ação depende sobretudo do empenho da população.

Há  relação entre infestação de dengue e áreas desmatadas?
Os maiores índices de infestação são registrados em bairros com alta densidade populacional e baixa cobertura vegetal, onde o mosquito encontra alvos para alimentação mais facilmente. Outro fator importante é a falta de infra-estrutura de algumas localidades. Sem fornecimento regular de água, os moradores precisam armazenar o suprimento em grandes recipientes que na maioria das vezes não recebem os cuidados necessários e acabam tornando-se focos do mosquito porque não são vedados completamente. Portanto, os esforços para o controle da proliferação do mosquito certamente estão relacionados a medidas do governo, mas sobretudo ao comprometimento da população.

A que se deve o recente aumento da população de mosquitos no Rio de Janeiro?
O Aedes aegypti é atraído por altos índices de temperatura e umidade. Por isso, o clima do Rio de Janeiro é, sim, favorável à sua proliferação. Por isso, também, a infestação pelo mosquito é sempre mais intensa no verão. Para evitar esta situação é preciso desenvolver medidas permanentes para o controle do mosquito, durante todo o ano, a partir de ações preventivas que objetivem a eliminação de focos do vetor.

 Genilton Vieira/IOC

 

 O A aegypti é mais facilmente encontrado em áreas urbanizadas e com pouca cobertura vegetal (imagem do filme O mundo Macro e Micro do Mosquito Aedes aegypti - para combatê-lo é preciso conhecê-lo, disponível aqui)


Quais os hábitos de vida do Aedes aegypti?
O Aedes aegypti é um mosquito doméstico, vive dentro ou ao redor de casa ou de outras construções frequentadas por humanos, como estabelecimentos comerciais e escolas, por exemplo. Ou seja, ele está sempre perto do homem e não se aventura às matas por exemplo. Tem hábitos preferencialmente diurnos e alimenta-se de sangue humano, sobretudo ao amanhecer e ao entardecer. Mas, como é oportunista, pode picar à noite, quando uma pessoa se aproxima muito do local onde o mosquito se esconde, como embaixo de móveis.

 Genilton Vieira/IOC

 

 A reprodução do A. aegypti acontece em água limpa e parada, a partir da postura de ovos pela fêmea, que precisa de sangue para fecundar. Na imagem, a metamorfose da pupa em mosquito.

O mosquito teria, recentemente, mudado de comportamento?
Não. O Aedes aegypti não desenvolveu novos hábitos. É um mosquito doméstico, vive dentro de casa e perto do homem. Tem hábitos diurnos e alimenta-se de sangue humano, sobretudo ao amanhecer e ao entardecer. A reprodução acontece em água limpa e parada, a partir da postura de ovos pelas fêmeas. Os ovos são colocados em água limpa e parada e distribuídos por diversos criadouros – estratégia que garante a dispersão da espécie. Se a fêmea estiver infectada pelo vírus da dengue quando realizar a postura de ovos, há a possibilidade de as larvas já nascerem com o vírus – a chamada transmissão vertical.

Como se dá a convivência entre Aedes aegypti e Culex? Há disputa de espaço?
Não há disputa significativa porque os dois mosquitos alimentam-se de sangue e açúcar, disponíveis em abundância no ambiente urbano. Além disso, enquanto o Aedes aegypti é um inseto diurno que se reproduz em água limpa, mosquitos do gênero Culex preferem criadouros com alta concentração de matéria orgânica em decomposição e têm atividade estritamente noturna.

 Genilton Vieira/IOC

 

 Uma fêmea do A. aegypti pode dar origem a 1.500 mosquitos durante sua vida. Os ovos são distribuídos por diversos criadouros, estratégia que garante a dispersão e preservação da espécie. Na imagem, o A. aegypti em fase de pupa.

 E com o Aedes albopictus, que também transmite a dengue?
O Aedes aegypti é o principal vetor da dengue. No entanto, em algumas áreas, sobretudo no sudeste da Ásia, o Aedes albopictus atua como vetor secundário. Acredita-se que esse mosquito tenha sido introduzido no Brasil na década de 1980, mas como a sua infecção natural pelo vírus da dengue ainda não foi comprovada no país, as medidas de controle da doença não têm o Aedes albopictus como foco. Além disso, não há coincidência entre a prevalência de Aedes albopictus e a ocorrência de dengue. Como as duas espécies são encontradas em ambientes urbanos, pode haver competição na fase imatura (larvas e pupas), dependendo da quantidade de água disponível.

Quais os principais criadouros do Aedes aegypti?
Em pesquisas de campo realizadas recentemente, verificamos que os grandes reservatórios, como caixas d’água, galões e tonéis, são os criadouros mais produtivos do Aedes aegypti. Isso não significa que a população possa descuidar da atenção a pequenos reservatórios, como vasos de plantas, que comprovadamente atuam como criadouros. O alerta é para que os cuidados com os reservatórios de maior porte sejam redobrados, pois é neles que o mosquito seguramente encontra condições para se desenvolver de ovo a adulto. Em alguns bairos suburbanos, estes grandes criadouros produzem quase 70% do total de mosquitos adultos, ou seja, que podem nos picar e transmitir o vírus da dengue.

 Gutemberg Brito/IOC

 

 Grandes reservatórios, como caixas d'águas e tonéis, são os criadouros preferidos do mosquito. Pequenos recipientes, porém, como vasos de planta, também exigem cuidado. Acima, imagem de um criadouro com larvas.

Como o mosquito se reproduz?
O acasalamento do Aedes ageypti se dá dentro ou ao redor das habitações, geralmente nos três primeiros dias depois que o mosquito atinge a superfície do criadouro. Embora possa se alimentar com sangue antes da cópula, as fêmeas intensificam a voracidade pela hematofagia após a fecundação, quando precisam ingerir sangue para realizar o desenvolvimento completo dos ovos e maturação dos seus ovários. Normalmente as fêmeas engravidam três dias após a ingestão de sangue, passando então a procurar local para desovar.

A desova acontece em criadouros com água limpa e parada, onde os ovos depositados são aderidos às paredes do recipiente, bem próximo à superfície da água, porém não diretamente sobre o líquido. Uma fêmea pode dar origem a 1.500 mosquitos durante a sua vida. Os ovos são distribuídos por diversos criadouros – estratégia que garante a dispersão e preservação da espécie. Se a fêmea estiver infectada pelo vírus da dengue quando realizar a postura de ovos, há a possibilidade de as larvas já nascerem com o vírus – a chamada transmissão vertical.

Quantas pessoas um mosquito é capaz de infectar?
O vírus pode ser transmitido a quantas pessoas uma fêmea do Aedes aegypti  infectada possa picar.

Por que se só a fêmea pica?
A fêmea precisa de sangue para a produção de ovos. Tanto o macho quanto a fêmea se alimentam de substâncias que contêm açúcar (néctar, seiva, entre outros), mas como o macho não produz ovos, não necessita de sangue.

Quanto tempo um ovo leva para se transformar em um mosquito adulto capaz de infectar o homem?
Este ciclo varia de acordo com condições climáticas, a disponibilidade de alimentos e a quantidade de larvas existentes no mesmo criadouro, uma vez que a competição de larvas por alimento em um mesmo criadouro com pouca água consiste em um obstáculo ao amadurecimento do inseto para a fase adulta. No Rio de Janeiro, esse processo é realizado geralmente em um período de oito a doze dias.

O ovo, que mede aproximadamente 1 mm de comprimento, é depositado pela fêmea do Aedes aegypti nas paredes internas dos criadouros, próximos à superfície da água. O desenvolvimento do embrião é concluído em 48 horas, em condições favoráveis de umidade e temperatura. Do desenvolvimento embrionário à eclosão, os ovos podem resistir a longos períodos de dessecação – até 450 dias em média. Este período varia segundo diversos critérios, como o clima: a resistência é menor em locais mais quentes e secos. A capacidade de resistência dos ovos de Aedes aegypti à dessecação por até 450 dias é um aspecto importante do ciclo de vida do mosquito, que demonstra a necessidade do combate continuado aos criadouros, em todas as estações do ano. Esta resistência permite que os ovos sejam transportados a grandes distâncias, em recipientes secos, tornando-se assim o principal meio de dispersão do inseto – dinâmica conhecida como dispersão passiva.
 

 Genilton Vieira/IOC

 

 Depositados pelas fêmeas nas paredes internas dos criadouros, próximos à superfície da água, os ovos do A. aegypti podem resistir até 450 dias.

Usar calça comprida e meias pode colaborar para a prevenção à picada do mosquito?
Sim, porque o Aedes aegypti pica as pessoas preferencialmente nas pernas e nos pés. Ele tem rejeição à claridade e é atraído pelo calor, por isso teria preferência por tecidos escuros. No entanto, as picadas também podem ocorrer em outras partes do corpo, mesmo que a pessoa esteja protegida por roupas. O importante é eliminar os criadouros do mosquito, para que ele não circule.

Permitida a reprodução do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz). Para reprodução de imagens, favor encaminhar solicitação através do email jornalismo@ioc.fiocruz.br


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