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Carlos Chagas

 Calos Chagas
Carlos Ribeiro Justiniano Chagas nasceu em 9 de julho de 1879, numa fazenda próxima à cidade de Oliveira, oeste de Minas Gerais. Em 1897, ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, num momento em que a área médica vivia a efervescência da chamada “era bacteriológica”. Sob o primado do laboratório, eram produzidos novos conceitos e conhecimentos sobre a etiologia e os modos de transmissão das doenças infecciosas. Sua tese de doutoramento para conclusão do curso médico, abordando os aspectos hematológicos da malária, foi desenvolvida no Instituto Soroterápico Federal ou Instituto de Manguinhos (criado em 1900 e denominado, a partir de 1908, Instituto Oswaldo Cruz). Formado em 1903, Carlos Chagas abriu consultório no centro do Rio e, como médico da Diretoria Geral de Saúde Pública (então dirigida pelo sanitarista Oswaldo Cruz, que acumulava o cargo com a direção do Instituto de Manguinhos), trabalhou no hospital de Jurujuba, Niterói.

Em 1905, foi encarregado por Oswaldo Cruz de coordenar medidas de profilaxia da malária em Itatinga, interior de São Paulo, onde uma epidemia da doença vinha prejudicando obras da Companhia Docas de Santos. Foi a primeira campanha antipalúdica realizada no Brasil. Dois anos depois, combateu outra epidemia da doença em Xerém, na Baixada Fluminense, onde a Inspetoria de Obras Públicas realizava a captação de águas para a capital federal. Constatando que a transmissão da malária ocorria fundamentalmente no interior dos domicílios, Chagas formulou a noção de que, além dos métodos antilarvários e da aplicação de quinina, a profilaxia deveria concentrar-se no ataque aos mosquitos adultos, mediante aplicação de inseticidas como o piretro nestes ambientes. A teoria da infecção domiciliária da malária e o método profilático nela baseado seriam considerados contribuições pioneiras à malariologia e base para o uso extensivo dos inseticidas sintéticos, como o DDT, a partir da década de 1940.

Em junho de 1907, Chagas foi designado para combater uma epidemia de malária que grassava no norte de Minas Gerais, na região do rio das Velhas, entre Corinto e Pirapora, e paralisava o projeto que pretendia integrar o sul ao norte do país através do prolongamento da Estrada de Ferro Central do Brasil, do Rio até Belém. Na pequena vila de Lassance, onde se construía uma estação da ferrovia, ele improvisou um laboratório num vagão de trem, que também usava como dormitório. Enquanto coordenava as atividades de profilaxia, costumava observar e examinar espécies da fauna brasileira, devido a seu crescente interesse pela entomologia.

Examinando o intestino de um inseto hematófago comum na região, que proliferava nas paredes barreadas das casas de pau-a-pique e era popularmente conhecido como barbeiro, Chagas identificou, em dezembro de 1908, um protozoário flagelado. Mediante experiências realizadas no Instituto de Manguinhos, comprovou tratar-se de uma nova espécie de tripanossoma, à qual denominou Trypanosoma cruzi, em homenagem a Oswaldo Cruz. De volta a Lassance, em 14 de abril de 1909, Chagas encontrou o novo parasito no sangue de uma criança febril de dois anos, chamada Berenice, que seria então considerada o primeiro caso da doença que levaria o nome do pesquisador – a doença de Chagas ou tripanossomíase americana. O feito foi considerado único na história da medicina: o mesmo pesquisador, num curto espaço de tempo, identificara o vetor, o parasito e uma nova enfermidade.

A descoberta, realizada num contexto internacional de difusão e institucionalização da medicina tropical, consolidou a protozoologia como uma das principais áreas de pesquisa do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), trazendo grande prestígio científico a Chagas e à instituição, onde ele havia se integrado como pesquisador assistente em março de 1908. Em 1910, a Academia Nacional de Medicina abriu uma vaga extraordinária para recebê-lo como membro titular. Em 1912, foi agraciado com o Prêmio Schaudinn de protozoologia, concedido pelo Instituto de Medicina Tropical de Hamburgo. Neste mesmo ano, Oswaldo Cruz obteve verbas especiais para construir, em Manguinhos, um hospital destinado ao estudo de doenças infecciosas, que se tornaria a principal sede das pesquisas clínicas sobre a nova tripanossomíase, juntamente com um pequeno hospital montado em Lassance.

A partir de então, Chagas receberia diversas homenagens, títulos e condecorações. Em 1921, foi o primeiro brasileiro a receber o título de doutor honoris causa da Universidade de Harvard (Estados Unidos). A mesma distinção lhe foi concedida em 1926 pela Universidade de Paris (França). Foi membro de inúmeras instituições médicas e científicas no Brasil e no exterior, entre as quais a Academia Brasileira de Ciências, a Associação Médica Argentina, a Associação Médica Pan-Americana, a Société de Pathologie Exotique, a Royal Society of Tropical Medicine and Hygienne, a Société Royale des Sciences Medicales et Naturelles de Bruxelas, e as academias de medicina de Paris, Madri, Roma e Nova York. Por duas vezes foi indicado ao Prêmio Nobel, em 1913 e 1921.

Com a colaboração de vários cientistas do IOC, como Gaspar Vianna, Astrogildo Machado, Eurico Villela, Arthur Neiva, Ezequiel Dias, Magarinos Torres e outros, realizou, até o final de sua vida, estudos sobre os vários aspectos da nova doença, como as características biológicas do vetor, do parasito e de seu ciclo evolutivo, o quadro clínico, as características epidemiológicas, os mecanismos de transmissão e as técnicas de diagnóstico.

Entre 1912 e 1913, em função das preocupações do governo com a crise no extrativismo da borracha, chefiou uma expedição científica ao vale do Rio Amazonas, para estudar as condições sanitárias da região. O relatório oficial da viagem, juntamente com os relatos de outras expedições realizadas por pesquisadores do IOC ao interior do país na década de 1910, denunciou o abandono médico e social em que viviam as populações rurais brasileiras. Chagas foi uma das lideranças do movimento sanitarista que, nesta década, reuniu médicos, cientistas e intelectuais em torno da idéia de que o atraso do país era fruto das endemias que assolavam seu interior, como a malária, a ancilostomose e a tripanossomíase americana, e que, portanto, o combate a tais enfermidades deveria ser uma prioridade do Estado.

Em fevereiro de 1917, por ocasião do falecimento de Oswaldo Cruz, assumiu a direção do IOC. Sua administração em Manguinhos, que se estenderia até sua morte em 1934, foi marcada pelo empenho em ampliar as áreas de pesquisa, produção e ensino, conforme modelo firmado por Oswaldo Cruz.  Para conferir maior formalidade às áreas de trabalho, criou seções científicas, definidas por campos do conhecimento, como Química Aplicada, Micologia, Bacteriologia e Imunidade, Zoologia Médica, Anatomia Patológica, Protozoologia e Fisiologia.

Estendeu o programa do Curso de Aplicação do Instituto, oferecido desde 1908 por seus pesquisadores – entre os quais o próprio Chagas – como especialização em Microbiologia e Zoologia Médica. Diversificou a pauta de produtos biológicos fabricados no Instituto, estimulando sua comercialização. Em 1918, organizou o Serviço de Medicamentos Oficiais, criado por decreto federal para fabricar e fornecer quinina e outros produtos a instituições públicas e privadas. Em 1920, estabeleceu um serviço de controle da qualidade dos imunobiológicos fabricados ou importados pelos laboratórios nacionais e incorporou a Manguinhos a produção da vacina antivariólica.

Além da direção do IOC, Chagas destacou-se em sua atuação à frente dos serviços federais de saúde pública. Em 1918, foi incumbido pela Presidência da República de coordenar o combate à devastadora epidemia de gripe espanhola na capital federal. A dedicação integral em garantir assistência à população foi um dos fatores que pesou na escolha de seu nome para comandar uma ampla reforma sanitária, implementada com a criação, em fins de 1919 e em conformidade com as reivindicações do movimento sanitarista, do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP).

Como diretor do novo órgão federal, cargo que assumiu em acúmulo com a direção do IOC e no qual permaneceria até 1926, criou um extenso Código Sanitário que organizou e modernizou a legislação sanitária brasileira. As ações sanitárias, até então concentradas nas áreas urbanas, foram estendidas para o interior do país com a criação de postos de profilaxia rural. Para isso, contou com a decisiva colaboração da Fundação Rockefeller, que atuava no país desde 1916. Os cuidados com a maternidade e a infância, a assistência hospitalar e o combate à tuberculose, à sífilis e à hanseníase foram também contemplados com a criação de órgãos e instituições especializadas. A partir de 1923, foi membro do Comitê de Saúde da Liga das Nações.

Igualmente com o auxílio e a orientação da Fundação Rockefeller, investiu na formação de profissionais especializados em saúde pública, com a criação, em 1923, da Escola de Enfermagem Anna Nery, a primeira do país. Em 1926, organizou o Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, ministrado por pesquisadores do IOC como especialização na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Defendendo uma concepção de ensino médico em estreita vinculação com a pesquisa científica e voltado para as questões de saúde pública do país, foi o primeiro titular da cadeira de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, criada em 1925.

Faleceu subitamente aos 55 anos, por problemas cardíacos, em 8 de novembro de 1934.

Fonte: Kropf, Simone Petraglia; Hochman, Gilberto, “Chagas, Carlos Ribeiro Justiniano”, Bynum, W.F.; Bynum, H. (eds.). Dictionary of medical biography. Greenwood Press, Westport, Connecticut/London, v. 2, 2007, pp. 320-5.

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