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Fundação Oswaldo Cruz

Organismos geneticamente modificados e atores diretamente impactados: Como agricultores brasileiros avaliam os cultivos transgênicos?

Tese (Doutorado) - 2012

Autora: Carla da Silva Almeida

Programa Educação, Gestão e Difusão em Biociências, Instituto de Bioquímica, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Resumo

A ciência e seus desenvolvimentos ganham importância crescente no mundo moderno. Algumas de suas aplicações geram particular ansiedade e polêmica, caso dos organismos geneticamente modificados (OGMs). Sua introdução na cadeia produtiva de alimentos motivou debates acirrados em diversos países. No Brasil, as controvérsias tiveram início nos
anos 1990, intensificando-se em 2003, quando se soube que parte significativa da soja brasileira vinha de plantações ilegais de sementes geneticamente modificadas no Sul. Uma trajetória deliberativa conturbada seguiu-se até a aprovação da Lei de Biossegurança, em 2005. Durante a consolidação desse marco legal, as tentativas de compreender a opinião da
sociedade sobre os OGMs foram tímidas. Em algumas ocasiões, as percepções leigas foram invalidadas e o discurso científico, privilegiado. Os pequenos agricultores, diretamente afetados pela tecnologia e protagonistas de sua disseminação, tiveram envolvimento restrito no debate. O objetivo deste trabalho é compreender como esses atores avaliam os OGMs, que dilemas enfrentam diante dessa biotecnologia, como se posicionam e tomam decisões referentes a ela. Foram realizados 15 grupos focais com 111 produtores de terras com até 100 hectares no Acre, Paraná e Rio Grande do Sul. Os dados foram analisados com base na Teoria Semiolinguística de Patrick Charaudeau, inserida na escola francesa da análise do discurso. Constatou-se que a polarização do debate público sobre OGMs não se reflete no discurso dos agricultores, mais ponderado e nuançado. Suas posições sobre cultivos transgênicos variam de acordo com diversos fatores, sobretudo pragmáticos, relativos às vantagens/desvantagens práticas e financeiras da cultura, mas também relacionados a percepções de riscos, questões de ordem moral e ética, crenças ideológicas e religiosas. O plantio de sementes de soja transgênica apresentou diferentes resultados, mesmo para agricultores cultivando-as na mesma região, evidenciando a influência de outros aspectos no rendimento da produção e na satisfação do produtor. Num primeiro momento, sua introdução parece ter resolvido dificuldades no controle de pragas e reduzido custos de produção, mas depois as pragas voltaram e os custos subiram. A disseminação ilegal e descontrolada da soja transgênica no Brasil, sem um sistema adequado de segregação, inviabilizou o plantio da soja convencional, impossibilitou a criação de um mercado diferenciado para ela e privou o consumidor de informações idôneas sobre os alimentos que compra. As discussões mais abrangentes sobre a tecnologia trouxeram à tona tanto percepções positivas da ciência quanto sentimentos ambíguos sobre os seus impactos. Os pequenos produtores querem participar das decisões ligadas à agricultura, mas são pouco engajados, refletindo a parca tradição participativa da sociedade civil brasileira. Diante da oportunidade de troca, porém, mostraram interesse, motivação e capacidade de reflexão sobre temas complexos e evidenciaram carência de informações idôneas e desinteressadas. Isso aponta para a necessidade de iniciativas mais inclusivas e dialógicas de divulgação científica e o desenvolvimento de mecanismos de participação voltados a esses e demais cidadãos, que contribuam para criar laços mais fortes entre ciência e sociedade e construir uma demanda permanente por democracia, na qual as
decisões considerem a diversidade de opiniões, culturas e saberes do país.

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