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Esperança para pacientes de sepse

Pesquisadores descobrem que medicamento já usado no tratamento de colesterol também pode reduzir os danos neurológicos de pacientes que tiveram sepse

A sepse é um processo de resposta inflamatória generalizada associada a uma infecção (de origem bacteriana, viral ou parasitária) que causa danos em múltiplos órgãos, podendo levar o paciente à morte. Danos neurológicos vêm sendo observados nos pacientes que sobrevivem à sepse, com sintomas que podem incluir delírios, déficit de atenção e problemas de memória, acarretando limitações que podem ser irreversíveis. Com o objetivo de investigar uma estratégia que minimize o problema, pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) comprovaram que substâncias já conhecidas dos médicos podem ser eficazes: as estatinas, comumente usadas no controle do colesterol. Em testes com camundongos, foi verificado que o medicamento produz efeitos protetores, reduzindo os danos neurológicos na situação de sepse.

Por ser considerada a principal causa de mortalidade em Unidades de Terapia Intensiva, muitas pessoas acreditam que a infecção causadora da sepse ocorre exclusivamente em ambiente hospitalar. O biomédico Pedro Celso Braga Alexandre, que elaborou o estudo durante o doutoramento no Programa de Pós-graduação em Biologia Celular e Molecular do IOC, esclarece que este é um mito comum. “Infecções comunitárias que uma pessoa adquira, também podem ocasionar o quadro de sepse”, alerta o especialista.

Em busca de proteção ao sistema nervoso central

Pedro é orientado pelo médico Hugo Castro Faria-Neto, pesquisador doLaboratório de Imunofarmacologia do Instituto, que há anos investiga os processos biológicos relacionados à sepse. Em estudos recentes, os pesquisadores identificaram que o sistema nervoso central é afetado pela sepse na medida em que interfere em diversas vias de sinalização – verdadeiras cascatas que ligam e desligam os processos celulares. O interesse de Pedro era justamente identificar novas formas de tratamento que pudessem minimizar os danos no sistema nervoso central. Foi quando entraram em cena as estatinas. 

Diversos estudos apontam que as estatinas desempenham papel importante em processos inflamatórios. Com base nestes dados, Pedro decidiu testar se, também no caso da sepse, as estatinas poderiam amenizar os prejuízos gerados pelo processo inflamatório. “Atualmente, não existem medicamentos específicos disponíveis para tratar os danos que a sepse causa no sistema nervoso central. O nosso objetivo era justamente propor uma nova estratégia terapêutica que pudesse ajudar esses pacientes, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida”, explica.

Gutemberg Brito

Durante sua tese de doutorado, o biomédico Pedro Braga verificou o potencial de ação das estatinas sobre diversos processos celulares ligados ao cérebro


O processo

Para verificar o potencial das estatinas na proteção a neuroinflamação relacionada à sepse, as substâncias foram testadas em camundongos. O primeiro desafio foi padronizar o modelo utilizado nesta fase experimental, aprimorando os protocolos científicos usados atualmente para que os animais apresentassem danos cognitivos semelhantes aos dos humanos, porém com o menor grau possível de abordagens. “Nós padronizamos um modelo que dispensa o uso de anestésicos ou cirurgias, procedimentos que podem interferir em receptores importantes do sistema nervoso central e na recuperação dos animais. Desta forma, chegamos a um modelo que nos permitiu obter resultados em que essas variáveis não influenciavam”, justifica Pedro.

Foram testados dois tipos de estatinas: a sinvastatina e a atorvastatina. Para comparar os efeitos de cada uma, diferentes grupos de animais receberam o tratamento por via oral, uma hora antes da indução do quadro de sepse. A meta era conferir se algum efeito protetor ocorreria já neste momento inicial, uma vez que as substâncias atingem seu pico de efeito em torno de uma a quatro horas após a administração. Em seguida, os animais receberam o mesmo protocolo de tratamento adotado na rotina dos pacientes com sepse – tratamento com antibióticos e soro – em intervalos após 6h, 24h e 48h do início do quadro séptico.

Decorridos 15 dias do início do quadro de sepse, os camundongos foram submetidos a testes de memória padronizados internacionalmente. Os resultados indicam que os animais que foram tratados com as estatinas tiveram uma proteção contra o dano cognitivo gerado pela sepse. A inflamação, apesar de bastante reduzida, não foi completamente eliminada. No caso da proteção ao dano cognitivo, as estatinas protegeram ou reverteram o dano de forma parcial.

As análises de amostras de sangue e do tecido cerebral indicaram que, quando receberam o tratamento com as estatinas, os animais mostraram melhor prognóstico da doença, reduzindo a gravidade. Além disso, elas se mostraram eficazes na redução dos níveis de diversos mediadores inflamatórios presentes no sangue e no cérebro dos camundongos, incluindo parâmetros relevantes. Parte dos estudos realizados nesta etapa contou com a colaboração do Laboratório de Investigação Cardiovascular do IOC.

O orientador do estudo ressalta que um dos benefícios de investigar o potencial das estatinas no tratamento da sepse é que a chegada desta novidade aos pacientes pode ser acelerada, já que o medicamento está disponível no mercado – o que significa que a etapa de testes de segurança e de dosagem, dentre outros, já foi superada. Porém, para que a descoberta científica realizada em laboratório resulte em mudanças nos protocolos de tratamento de pacientes, novos dados serão necessários. “A nossa pesquisa sugere que estas drogas podem ter um impacto favorável reduzindo, em longo prazo, a neuroinflamação e as sequelas causadas pela encefalopatia associada a sepse, principalmente o declínio cognitivo”, pontua o pesquisador Hugo Caire. “No entanto, ainda são necessários estudos pré-clínicos mais detalhados, no sentido de estabelecer com maior precisão as condições exatas aonde as estatinas seriam indicadas”, concluiu o pesquisador.


Paula Netto
24/06/2015
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