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Novas perspectivas sobre doenças infecciosas

Seminário que integra comemorações de 114 anos do IOC mostrou que combate a estas patologias vai além da busca por drogas para matar parasitos. Os pesquisadores também discutiram políticas científicas para estimular a inovação

Parte das comemorações pelos 114 anos do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), o seminário 'Novos desafios na Pesquisa e Controle de Processos Infecciosos' mostrou que o enfrentamento destas doenças vai muito além da estratégia de buscar substâncias capazes de matar os parasitos. O evento, realizado nesta segunda-feira, 26 de maio, reuniu na mesa de abertura o diretor do IOC/Fiocruz, Wilson Savino, e o presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Paulo Gadelha. Além de avanços nas pesquisas científicas da área, o diretor do Centro de Pesquisa Gonçalo Muniz (Fiocruz/Bahia), Manoel Barral Netto; o diretor do Instituto Carlos Chagas (Fiocruz/Paraná), Samuel Goldenberg; e o pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e diretor científico da Faperj, Jerson Lima Silva, discutiram estratégias de política científica para estimular trabalhos inovadores, com alto impacto sobre a saúde da população.

 Gutemberg Brito

 

    Seminário sobre doenças infecciosas debateu avanços científicos e estratégias para transformar descobertas em melhorias para a saúde   

Diante de um volume cada vez maior de dados disponíveis, Manoel Barral Netto defendeu que integrar diferentes informações pode mudar a percepção sobre as doenças e estimular o desenvolvimento de novas formas para combatê-las. Apresentando estudos recentes sobre malária, ele afirmou que alguns mecanismos de defesa são exacerbados em pacientes com formas graves da patologia, mas a rede do sistema imune como um todo está mais ativada nos portadores assintomáticos. “Manter um indivíduo sem sintomas requer um gasto de energia muito grande do organismo, pois são necessárias muitas interações moleculares. Já os pacientes com malária grave perdem as conexões em suas redes de defesa. Mas não é possível perceber isso sem uma análise mais ampla dos dados”, ressaltou o imunologista.

Também defendendo a importância de integrar conhecimentos, Samuel Goldenberg abordou os avanços da genética e dos estudos sobre o microbioma. De acordo com ele, assim como o DNA do ser humano, o material genético de diversos parasitos já foi sequenciado e há cada vez mais pesquisas sobre o papel dos genes e das proteínas codificadas por eles, a chamada genômica funcional. Ao mesmo tempo, os cientistas estão empenhados em mapear os micro-organismos que vivem normalmente no corpo humano e já encontraram algumas associações deste microbioma com o desenvolvimento de doenças. “A medicina personalizada é uma tendência. No futuro, o médico poderá pedir um exame de sequenciamento genético e um levantamento do microbioma do paciente para receitar um medicamento desenvolvido especialmente para ele”, afirmou Samuel.

 Gutemberg Brito

 

  "Esse futuro, em que a medicina será personalizada, está próximo",
                                 disse Samuel Goldenberg

Autor de pesquisas sobre doenças causadas por príons, Jerson Lima Silva explicou que ‘proteínas infecciosas’ também parecem estar envolvidas em patologias como Parkinson e Alzheimer e em diversos tipos de câncer. Causadores de doenças como o Mal da Vaca Louca, os príons são proteínas que se dobram de forma errada, tornando-se capazes de induzir mudanças na forma de outras proteínas e de formar agregados que prejudicam o funcionamento dos neurônios, levando-os à morte. Segundo Jerson, diversos estudos já mostraram que processos semelhantes ocorrem em doenças neurodegenerativas. No câncer, o grupo do pesquisador identificou que a proteína P-53 – considerada guardiã do DNA e uma das principais responsáveis por evitar a formação de tumores – também passa a se dobrar de maneira errada, o que pode ser um dos mecanismos moleculares para surgimento da patologia. “Isso parece uma notícia ruim, mas abre oportunidades para o desenvolvimento de novas drogas que combatam estas doenças”, disse o biofísico.

Desafio para gerar impacto na saúde

Apesar dos avanços significativos das pesquisas básicas para compreender as doenças e buscar novos alvos terapêuticos, os pesquisadores avaliaram que ainda faltam medidas para transformar mais rapidamente as descobertas em melhorias na saúde da população. Segundo Manoel Barral Netto, um levantamento realizado pela Fiocruz/Brasília na plataforma de publicação científica PubMed mostrou que o Brasil é o país que mais produz artigos sobre leishmaniose, e entre 24 mil trabalhos publicados analisados, 8 mil estavam relacionados com estratégias de tratamento. No entanto, na fase de ensaios clínicos, havia apenas 21 pesquisas registradas nos EUA e nenhuma no Brasil. “Ou seja, hoje nós produzimos um grande volume de conhecimento, mas não do tipo que vai refletir mais diretamente na vida dos pacientes. Precisamos de planejamento para que a produção científica impacte mais rapidamente na saúde”, avaliou o diretor da Fiocruz/Bahia.

 Gutemberg Brito

 

Em sua apresentação, Manoel Barral Netto ressaltou que a Fiocruz tem
o compromisso de produzir pesquisas que afetem a saúde das pessoas

O diretor do IOC defendeu a necessidade de linhas de crédito direcionadas para a inovação científica. “Este tipo de financiamento foi gradualmente diminuindo nos editais. Mas em outros países, como na Argentina, há editais específicos para essa área. Isso seria importante tanto em financiamentos intramuros quanto em ações de agências de fomento de nível estadual e federal”, afirmou Wilson Savino.

A estratégia adotada no país vizinho para estimular a inovação também foi considerada interessante pelo diretor da Faperj, que destacou ainda a importância de garantir a qualidade da produção científica para gerar novos produtos em saúde. Jerson Lima Silva afirmou que a ciência atual tem o desafio de dar um ‘salto de qualidade’. “Hoje, medimos o impacto das publicações pelo número de citações dos artigos, mas na verdade precisamos fazer descobertas. A inovação começa na bancada do laboratório”, ressaltou.

 Gutemberg Brito

 

  Jerson Lima Silva: "Para chegar à sociedade com rapidez, é preciso
                         produzir ciência com muita qualidade"

Além de defender a necessidade de aprimorar as formas de avaliação das pesquisas, o diretor da Fiocruz/Paraná ponderou que a responsabilidade de inovar não é apenas da academia. “Em outros países, grande parte da inovação que chega ao mercado não sai das universidades, mas sim da indústria. No Brasil, fazemos principalmente pesquisa acadêmica”, disse Samuel Goldenberg, acrescentando que nem sempre é preciso ter alta tecnologia para fazer pesquisas de qualidade. “Com um microscópio é possível fazer trabalhos extremamente relevantes”.

Paulo Gadelha ressaltou que os cientistas têm ainda o desafio de melhorar o diálogo com a sociedade. O presidente da Fiocruz citou uma liminar concedida pela Justiça da Bahia para impedir o uso de cães em pesquisas sobre leishmaniose e destacou que cabe à comunidade científica esclarecer a população sobre este tema. “A decisão do juiz já foi suspensa, mas é importante pensarmos em como lidar com a percepção pública sobre as ciências, especialmente no campo da experimentação animal”, afirmou.

Ao final do seminário, Savino avaliou que o evento cumpriu o objetivo proposto para as celebrações dos 114 anos do IOC/Fiocruz e da Fundação Oswaldo Cruz. “Comemoramos o aniversários do Instituto e da Fiocruz com discussões de alto nível do ponto de vista dos resultados científicos e dos debates sobre gestão de ciência e tecnologia e saúde”, disse. 


Maíra Menezes
27/05/2014
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