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Cavernas escondem risco para leishmanioses

Tese vencedora do Prêmio Alexandre Peixoto encontrou insetos transmissores infectados em cavernas de Minas Gerais, incluindo regiões turísticas. Três novas espécies foram descritas

Além de descrever três novas espécies de insetos flebotomíneos, transmissores das leishmanioses, a tese de doutorado do biólogo Gustavo Mayr de Lima Carvalho confirmou o risco de transmissão da doença em cavernas de Minas Gerais, algumas delas situadas em áreas de intensa atividade turística. As descobertas fizeram com que a pesquisa, intitulada ‘Estudos taxonômicos e bioecológicos de flebotomíneos (Diptera: Psychodidae) coletados em Províncias Espeleológicas Brasileiras’, fosse vencedora do Prêmio Anual IOC de Teses Alexandre Peixoto 2014, pelo Programa de Pós-graduação em Biologia Parasitária do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).

Segundo Gustavo, apesar de cada vez mais visitadas, as cavernas ainda são pouco exploradas por estudos sobre flebotomíneos e este foi um dos fatores que motivaram a pesquisa. “Hoje muitas cavernas estão abertas à visitação, recebendo turistas ou atividades econômicas. Com isso, informações sobre a diversidade biológica destes espaços podem ser perdidas e os visitantes também podem ser expostos a riscos inadvertidamente”, ressalta. Algumas das áreas escolhidas para o estudo já são bastante visitadas por turistas, como as cavernas localizadas no Parque Estadual de Ibitipoca, na Zona da Mata Mineira, e no município de Lassance, no Norte de Minas.

Foto: Gutemberg Brito

O talento de Gustavo na identificação de flebotomíneos foi destacado pelo orientador Reginaldo Brazil e pelo coordenador do Programa de Pós-graduação em Biologia Parasitária, Rafael de Freitas

Hipótese confirmada

Desde o início do estudo, a transmissão das leishmanioses era considerada uma possibilidade, uma vez que as cavernas podem servir de refúgio para animais silvestres, como raposas e lobos. Alguns deles podem ser reservatórios do parasito Leishmania, causador da doença. Assim, os flebotomíneos que vivem nestes espaços podem ser infectados ao sugar o sangue destes animais e depois transmitir o parasito para as pessoas por meio da picada. A hipótese foi confirmada pela pesquisa, que encontrou insetos portadores de Leishmania braziliensis, causadora da leishmaniose tegumentar, e de Leishmania infantum chagasi, que provoca a forma visceral da doença. “Estas são duas espécies importantes no ciclo de transmissão das leishmanioses no Brasil, o que mostra que é preciso cautela na visita e exploração das cavernas”, afirma Gustavo, que foi orientado por Reginaldo Peçanha Brazil, pesquisador do Laboratório de Doenças Parasitárias do IOC, e co-orientado por José Dilermando Andrade Filho, pesquisador e curador da Coleção de Flebotomíneos do Centro de Pesquisa René Rachou (Fiocruz-Minas). Segundo os pesquisadores, para prevenir a infecção é importante utilizar itens de proteção individual, como repelente, calça e blusa de manga comprida.

Reginaldo ressalta que, além de confirmar o risco de transmissão de doenças, a tese evidenciou a riqueza ecológica das cavernas. Durante um ano, insetos foram coletados mensalmente em Ibitipoca e Lassance. Em alguns casos, a diversidade de flebotomíneos verificada no interior das cavernas foi maior ou equivalente à registrada no entorno. “Algumas espécies vivem apenas no interior destes espaços. Elas se alimentam de morcegos, roedores ou outros mamíferos e possuem hábitos distintos por permanecer dentro das cavernas. Por exemplo, insetos noturnos picam mesmo durante o dia, porque o ambiente se mantém escuro”, diz Reginaldo.

Foto: arquivo pessoal/Gustavo Mayr

Entre os insetos coletados na cidade de Lassance, a pesquisa identificou uma nova espécie batizada de Evandromyia spelunca

Novas espécies

A pesquisa também incluiu a análise de insetos coletados em cavernas que pertencem à Coleção de Flebotomíneos da Fiocruz-Minas, detentora de um dos maiores acervos das Américas, reunindo espécimes coletados desde 1950. Em sua tese, Gustavo identificou três espécies novas. O caso mais curioso é do inseto batizado como Martinsmyia reginae:  oriundo da cidade de Arraias, em Tocantins, o pequeno flebotomíneo estava depositado na Coleção desde 1956 e apenas agora, quase 70 anos mais tarde, foi reconhecido como espécie nova. Além disso, outras duas espécies tiveram seu primeiro registro em cavernas de diferentes localidades de Minas Gerais. Em Lassance, os pesquisadores descreveram a espécie denominada Evandromyia spelunca. Já no município de Diamantina, um inseto capturado pelo pesquisador Ricardo Andrade Barata e enviado para análise deu origem à espécie Lutzomyia diamantinensis.

Esforço recompensado

As descobertas realizadas durante a elaboração da tese resultaram na publicação de sete artigos em revistas científicas nacionais e internacionais. Outros dois trabalhos estão em fase de redação. A produtividade da pesquisa é considerada um diferencial por Reginaldo. “Os flebotomíneos são um grupo difícil de estudar e não são muitas as pessoas que conseguem identificar corretamente as espécies deste inseto. Gustavo sempre se destacou pelo gosto pela sistemática e taxonomia e conseguiu realizar um trabalho muito bonito nas cavernas”, avalia o orientador. Sempre trabalhando com flebotomíneos, Gustavo foi aluno de iniciação científica e de mestrado na Fiocruz-Minas. Segundo ele, o doutorado no IOC/Fiocruz foi uma oportunidade de enriquecer ainda mais sua formação. “Tive a oportunidade de desenvolver minha tese em uma instituição altamente qualificada para formar pesquisadores. As cavernas são um ambiente difícil para trabalhar e nunca se sabe o que será descoberto durante a pesquisa. Para fazer ciência é preciso arriscar, mas também é necessário ter experiência e orientação. Além disso, é muito importante gostar do que se faz. Quando se tem tudo isso junto, o esforço é recompensado”, afirma.


Maíra Menezes
29/10/2014
Permitida a reprodução sem fins lucrativos do texto desde que citada a fonte (Comunicação / Instituto Oswaldo Cruz)

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