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Sinfonia de insetos na sala de aula

Sons emitidos por flebotomíneos serão usados para ensinar música e ciências a alunos do Ensino Fundamental. Iniciativa homenageia Alexandre Peixoto

Transformar sons produzidos por insetos em música e usar essa sinfonia em sala de aula, integrando os ensinos de ciências e artes. Esse é o objetivo de um projeto idealizado pelo Instituto de Bioquímica Leopoldo de Meis da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IBqM/UFRJ) com a parceria do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Além de buscar uma abordagem didática inovadora, a iniciativa é uma homenagem ao pesquisador Alexandre Peixoto, ex-chefe do Laboratório de Biologia Molecular de Insetos do IOC, morto no ano passado. “Perdemos um cientista jovem, que trabalhava numa fronteira do conhecimento, revelando como os sons podem ser importantes na vida dos insetos. Com essa proposta, vamos apresentar as descobertas feitas por ele aos estudantes e podemos inspirar outros jovens para a ciência”, afirma Mario Alberto da Silva Neto, coordenador do projeto e diretor geral do IBqM/UFRJ.

Foto: Gutemberg Brito

Para registrar os sons emitidos durante a cópula,
os flebotomíneos são colocados dentro da 'insecta box', que é equipada com microfone e câmera

A iniciativa acaba de ser aprovada no edital de ‘Apoio à difusão e popularização da ciência e tecnologia no estado do Rio de Janeiro – 2014’, da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). Batizada de ‘O som do silêncio: educação em ciências através da música erudita’, ela será baseada em sons produzidos por pequenos insetos chamados flebotomíneos, também conhecidos como mosquitos-palha. Registrados por um equipamento especial de gravação no Laboratório de Biologia Molecular de Insetos do IOC, estes ruídos são inaudíveis para o ouvido humano, mas fundamentais para a reprodução das espécies. “Os sons são emitidos durante a cópula e permitem que a fêmea identifique se o macho pertence à espécie dela. Em sentido figurado, podemos dizer que o macho canta para a fêmea e, se ela reconhece este canto, permite o acasalamento”, explica a pesquisadora Rafaela Vieira Bruno, chefe do Laboratório e integrante do projeto.

O sentido figurado mencionado por Rafaela é importante porque não se trata exatamente de um canto. Assim como o zumbido que escutamos quando mosquitos voam perto dos nossos ouvidos, os sons emitidos pelos insetos durante a cópula são produzidos pelo batimento das suas asas. No entanto, neste caso, eles precisam ser amplificados para se tornarem audíveis e apresentam uma característica especial: as variações de frequência, amplitude e ritmo determinam uma ‘melodia’ específica para cada espécie.

Respostas no som

Arte: Jefferson Mendes


O estudo deste padrão sonoro levou Alexandre Peixoto a avançar no conhecimento sobre o principal inseto transmissor da leishmaniose visceral no Brasil, o flebotomíneo Lutzomyia longipalpis. Avaliando exemplares coletados em diversas localidades do país, o pesquisador percebeu que eles emitiam sons distintos durante a cópula. Em experimentos de cruzamento, ficou comprovado que insetos originários de regiões diferentes levados para o laboratório copulavam, mas não geravam filhotes. Além disso, machos e fêmeas de espécies distintas que vivem no mesmo local (chamadas cientificamente de espécies simpátricas) não acasalavam. Na busca de respostas para esta questão, foram investigadas a produção de ferormônios – moléculas que são liberadas pelos machos para atrair parceiras sexuais – e sequências do DNA. Os resultados revelaram que não existia, de fato, uma única espécie Lutzomyia longipalpis. Classificados com este nome, estavam agrupados insetos com variações tão significativas que deveriam ser considerados de espécies diferentes, tornando o Lutzomyia longipalpis um complexo de espécies.

“Identificamos até o momento sete espécies diferentes com base em dados moleculares, bioquímicos e comportamentais. Nossos estudos evidenciam mecanismos de isolamento reprodutivo, como as diferenças nos tipos de som de cópula e de ferormônios. Mesmo quando insetos de duas espécies diferentes convivem no mesmo local, eles não copulam, o que sugere a existência de barreiras fortes que mantêm as espécies diferenciadas”, conta Alejandra Saori Araki, pós-doutoranda do Laboratório de Biologia Molecular de Insetos, que foi orientada por Alexandre Peixoto no doutorado em Biologia Celular e Molecular e continua desenvolvendo estudos na área juntamente com Felipe Vigoder, doutor pelo programa de Biologia Parasitária do IOC sob orientação do mesmo pesquisador.

Foto: Gutemberg Brito

Felipe, Saori e Rafaela explicam que, além da audição dos sons, a análise dos gráficos de ondas sonoras dos ruídos produzidos pelos insetos revela a diferença entre as espécies

Inovação no ensino

Assim como a abordagem dos pesquisadores foi pioneira na ciência, o método que será utilizado para transmitir este conhecimento aos estudantes também será inovador no ensino. O maestro Erivaldo Fraga vai utilizar os sons produzidos pelos insetos como inspiração para compor peças musicais, que serão ensinadas aos alunos do Ginásio Experimental Carioca Anísio Teixeira, na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio de Janeiro. Recém-admitido no programa de pós-graduação em Educação, Gestão e Difusão em Ciências do IBqM/UFRJ, o regente já começou a estudar os sons e conseguiu detectar neles características musicais. “Os insetos produzem as notas sol, ré e ré uma oitava acima. Essas notas são como cores primárias, que podem ser utilizadas para formar outras. Além disso, temos o ritmo, com som percussivo. Uma vez que os sons são curtos, inicialmente, estou pensando em escrever algumas suítes, que são pequenas peças musicais”, conta o regente.

Alunos do 8º ano do ensino fundamental devem participar do projeto, com aulas integradas de música e ciências. Enquanto aprendem a tocar as sinfonias, eles serão apresentados à origem dos sons e ao seu significado na biologia. De acordo com Mário, os estudantes também vão visitar laboratórios e insetários, aprendendo sobre o processo de construção do conhecimento científico. “A música e a ciência possuem aspectos de encantamento e atração. Acreditamos que unindo estas duas áreas podemos despertar o interesse dos estudantes”, avalia o professor.

No encerramento do projeto, que deve durar dois anos, está prevista a realização de um concerto em homenagem a Alexandre Peixoto. Para reforçar o grupo, músicos da Orquestra de Câmara da Ilha do Governador (OCIG), criada e regida por Erivaldo, devem se juntar aos estudantes. Animado, o maestro diz que também podem ser convidados integrantes da banda marcial e do coral do Ginásio Experimental Carioca Anísio Teixeira. “O formato final do concerto ainda não está definido, mas podemos fazer uma apresentação com violinos, flauta, clarineta e percussão, além do canto”, pondera.


Maíra Menezes
11/12/2014
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