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Caminhos para eliminação da malária

Metas estabelecidas pela OMS e plano brasileiro para combater os focos da doença foram debatidos em sessão especial do Centro de Estudos

Tentada sem sucesso na década de 1950, a eliminação da malária está novamente no foco das ações contra o agravo. Em maio do ano passado, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu o objetivo de eliminar a doença em 35 países até 2030, além de reduzir em 90% o total de casos e de mortes no mesmo período. Alinhado à proposta, o Ministério da Saúde lançou, em dezembro, o Plano de Eliminação da Malária no Brasil, inicialmente com ênfase nos casos provocados pelo parasito Plasmodium falciparum. A espécie é mais preocupante por estar associada a casos graves de malária, apesar de ser menos comum, no Brasil, do que o Plasmodium vivax. As estratégias e os desafios das ações de combate à doença nesse novo contexto concentraram as discussões na sessão especial do Centro de Estudos do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), realizada na sexta-feira, 29/04, em alusão ao Dia Mundial de Luta Contra a Malária, celebrado no dia 25/04. Com a presença de pesquisadores e estudantes, a atividade lotou o auditório Emmanuel Dias, do Pavilhão Arthur Neiva, no campus da Fiocruz, em Manguinhos, no Rio de Janeiro, em edição do tradicional fórum de debates científicos.

Foto: Gutemberg Brito

Centro de Estudos do IOC em homenagem ao Dia Mundial de Luta contra a Malária teve plateia lotada

Segundo a OMS, 3,2 bilhões de pessoas, que representam 44% da população do planeta, vivem sob risco de adquirir malária. Em 2015, uma criança morreu a cada dois minutos em consequência da doença. Na abertura da sessão especial do Centro de Estudos, o diretor do IOC, Wilson Savino, ressaltou a necessidade de chamar atenção para o agravo. “O Dia Mundial de Luta contra a Malária é fundamental porque essa doença continua sendo um problema extremamente sério no mundo”, declarou. Organizador da atividade, o chefe do Laboratório de Pesquisa em Malária do IOC, Cláudio Tadeu Daniel-Ribeiro, também destacou a importância da conscientização. Ele afirmou que o compromisso dos países deve ser a peça-chave para a eliminação da enfermidade. “Temos ferramentas que não estavam disponíveis na década de 1950, que podem nos permitir alcançar esse objetivo. Mas, para isso, será necessário investir US$ 8,7 bilhões por ano, o que é muito mais do que os 2,5 bilhões aplicados atualmente”, comentou o pesquisador, acrescentando que será preciso manter em vista os benefícios da medida. “A manutenção do controle da malária como se fosse um problema a ser vivido eternamente custará muito mais caro do que o combate de forma aguda, visando à eliminação. Além disso, o êxito desse projeto significará a redução de mortes e uma qualidade de vida superior para muitos indivíduos”, reforçou.

Colaboração e compromisso
O plano brasileiro para eliminação da malária foi apresentado por Cássio Roberto Leonel Peterka, representante do Programa Nacional de Controle da Malária (PNCM) do Ministério da Saúde. Neste ano, primeiro de implantação do projeto, R$ 12 milhões serão repassados aos municípios para as ações. No período de 2016 a 2019, o plano prevê a eliminação do agravo em 208 das 294 cidades da região amazônica que registram transmissão do P. falciparum no Brasil, além da redução do número de casos nos 86 municípios restantes. Segundo Cássio, a elaboração do projeto contou com a participação dos municípios e estados envolvidos, assim como de especialistas do Comitê Técnico de Assessoramento do PNCM e da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. A definição das metas levou em conta as orientações da OMS e as situações específicas de cada localidade. “É importante notar que quanto mais diminuímos o número de casos, mais difícil se torna o combate à doença. Ao mesmo tempo, na medida em que a malária deixa de ser um problema de grandes proporções, há maior dificuldade em manter a alocação de recursos. Por isso, é preciso compromisso das três esferas de governo”, ponderou ele.

Foto: Gutemberg Brito

Necessidade de compromisso das esferas municipal, estadual e federal de governo foi destacada pelo representante do PNCM

Em 2015, o Brasil registrou o menor número de casos de malária dos últimos 35 anos, com 143 mil notificações, sendo 15,4 mil causadas pelo P. falciparum. Em 2014, um ano antes do prazo estabelecido pela OMS, o país já tinha alcançado a meta de reduzir em 75% os casos da doença, como previsto nos Objetivos do Milênio. Apesar de o P. falciparum responder por um percentual menor dos casos de malária no Brasil, a decisão de iniciar o plano de eliminação com ênfase nessa espécie foi influenciada por dois fatores: a gravidade da infecção – que pode levar à morte caso o tratamento não seja iniciado de forma rápida – e o surgimento de cepas desse parasito que são resistentes ao medicamento artemisinina – o que pode dificultar o combate ao agravo no futuro. De acordo com o presidente da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT) e pesquisador do Instituto Leônidas e Maria Deane (Fiocruz-Amazônia), Marcus Vinícius Guimarães Larceda, a existência de tratamentos eficazes, testes rápidos de diagnóstico e métodos de prevenção, como o uso de mosquiteiros impregnados com inseticidas, forma o tripé que torna possível a eliminação da enfermidade. “O ciclo da malária envolve basicamente os seres humanos e os mosquitos, pois não existem reservatórios animais importantes. Uma vez que o homem é o principal reservatório do parasito, o diagnóstico e o tratamento precoces dos pacientes podem levar à eliminação”, explicou ele.

Desafios à vista
Mais de 99% dos casos de malária no Brasil ocorrem na região amazônica, área endêmica para a transmissão da doença no país. Além das condições naturais da floresta, os pesquisadores ressaltam que aspectos sociais e econômicos representam desafios importantes para o projeto de eliminação do agravo. Entre os 808 municípios da Amazônia brasileira, 37 concentram 80% das notificações. Considerando exclusivamente os casos provocados pelo P. falciparum, 80% dos registros ocorrem em apenas 11 cidades. Segundo o presidente da SBMT, a perspectiva é que a eliminação da malária seja mais difícil nas áreas de reservas indígenas e pólos de mineração. “Precisamos entender que a malária faz parte de um problema social. Nem sempre ter os insumos é a chave para o sucesso. As ferramentas para a eliminação existem, mas temos que levá-las até as populações mais vulneráveis”, pontuou Marcus.

Foto: Gutemberg Brito

Debate abordou desafios para eliminar a malária no Brasil e prevenir a reintrodução da doença

Uma vez que a maioria dos casos de malária no Brasil é causada pelo parasito P. vivax, os especialistas também avaliaram que esta será uma questão importante nas próximas etapas para a meta de eliminação. Diferentemente do P. falciparum, a infecção pelo P. vivax raramente leva à morte. No entanto, é mais difícil de ser combatida porque o parasito é capaz de desenvolver uma forma ‘dormente’, que pode permanecer inerte por meses ou anos no fígado dos pacientes até ser reativada. Considerando esse fator, a OMS publicou um resumo técnico no ano passado, reunindo as estratégias disponíveis para enfrentar a infecção e defendendo mais investimentos em pesquisa e inovação tecnológica para facilitar a tarefa.

O risco de reintrodução da doença após a eliminação também foi considerado como um ponto-chave. Participante da mesa de debates que encerrou a sessão, o integrante do Comitê Técnico de Assessoramento do PNCM e ex-assessor da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) Renato Gusmão comentou que existem ações coordenadas no plano internacional, mas a vigilância em cada país permanece essencial. “A região chamada de Escudo Guianês [que inclui cidades do Norte do Brasil, a Guiana Francesa, o Suriname, a Guiana e a Venezuela] é uma das que requerem atenção especial, pois a mobilidade de trabalhadores entre os países é alta. Isso gera um fluxo constante de pessoas, que pode facilitar a disseminação da malária”, citou ele. À frente do serviço de Referência Nacional para o Diagnóstico da Malária na Região da Extra-Amazônia, Cláudio também ressaltou a necessidade de alerta. “Na maior parte do Brasil, não temos mais casos de malária transmitidos localmente. Mas, devido à presença do vetor, a chegada de viajantes infectados pode fazer com que a doença volte a circular. Para impedir isso, a manutenção de uma rede de vigilância organizada é fundamental”, avaliou o pesquisador.

Reportagem: Maíra Menezes
03/05/2016
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