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Consequências além das malformações congênitas

Especialista defende que possibilidade de associação do Zika com doenças mentais, como autismo, deve ser investigada no futuro

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O epidemiologista Ian Lipkin, professor da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, considera que a possibilidade de associação do vírus Zika com doenças mentais é uma das questões que devem ser investigadas no futuro. O pesquisador é um dos cientistas à frente do estudo Coorte do Nascimento do Autismo (ABC, na sigla em inglês), que desde 2002, busca investigar fatores ambientais associados aos transtornos do espectro autista. Nesta segunda-feira, 07/11, ele proferiu a palestra ‘Caçando pequenos alvos: do autismo à Zika’, em sessão mediada pelo coordenador do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde (CDTS/Fiocruz), Carlos Morel, durante o evento ‘Zika’, promovido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Academia Nacional de Medicina (ANM) e Academia Brasileira de Ciências (ABC). O evento inclui os simpósios ‘The Zika menace in Americas: challenges and perspectives’ e ‘One year after the announcement of the national public health emergency in Brazil: lessons, achievements and challenges’.

“Até o momento, não há dados que apontem para isso [ocorrência de doenças mentais]. Porém, me parece óbvio que essa é uma hipótese considerando o espectro de danos causados pela Zika e o fato de que essa correlação ocorre em outras infecções”, afirmou Lipkin, lembrando que a Fiocruz e os Institutos Nacionais de Saúde (NIH, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, já iniciaram uma pesquisa do tipo coorte com o objetivo de acompanhar dez mil gestantes e seus bebês, desde o primeiro trimestre da gestação até o primeiro ano de vida das crianças.

Segundo Lipkin, pesquisas em modelos animais indicam que algumas reações imunológicas provocadas por doenças infecciosas podem contribuir para o desenvolvimento do autismo. “Quadros inflamatórios maternos, com desenvolvimento de febre, liberam citocinas, que são substâncias produzidas pelo sistema imunológico. Essas substâncias podem atravessar a placenta e provocar danos que não são perceptíveis no momento do nascimento, mas se revelam mais tarde”, explicou.

Gutemberg Brito

Professor da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos, Ian Lipkin destaca a importância da realização de estudos que considerem possíveis associações entre o vírus Zika e doenças mentais


Liderado pelo Instituto de Saúde Pública da Noruega em parceria com a Universidade de Columbia, o estudo ABC identificou crianças com transtornos do espectro autista nascidas na Noruega. O estudo acompanhou cerca de cem mil gestações desde 2003, diagnosticando as crianças que apresentaram a doença até os sete anos de idade. Além de informações sobre o período da gravidez e da primeira infância, os pesquisadores coletaram amostras com o objetivo de identificar fatores ambientais, como infecções e exposição a toxinas, que têm o potencial de funcionar como gatilhos para o desenvolvimento do autismo em pessoas com predisposição genética ou podem estar relacionados à ocorrência de mutações no genoma.

De acordo com Lipkin, as análises ainda estão em andamento, mas, a partir dos resultados iniciais do projeto, é possível afirmar que identificar os fatores ambientais envolvidos no desenvolvimento do autismo pode contribuir na prevenção da doença. “Observamos que há uma associação entre a ocorrência de febre na gestação e o desenvolvimento de transtornos do espectro autista. Porém, isso pode ser reduzido com tratamento da febre”, disse ele.

Oportunidade para prever a próxima epidemia

Responsável por identificar o vírus da febre do Oeste do Nilo quando a doença emergiu nos Estados Unidos, Lipkin atuou nos esforços para conter a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) na China, em 2003, e atualmente aconselha a Arábia Saudita no controle do vírus respiratório MERS, também causador de formas graves de manifestação respiratória. Considerado um dos maiores especialistas do mundo na detecção de patógenos, ele acredita que, em breve, a humanidade pode ser capaz de reconhecer vírus emergentes a tempo de prevenir epidemias, e as técnicas modernas de sequenciamento genético devem ser a chave desse processo.

Na conferência durante o evento ‘Zika’, o epidemiologista abordou a plataforma de sequenciamento genético VirCapSeq-VERT, desenvolvida por seu grupo de pesquisa para permitir a detecção de sequências virais em diversos tipos de amostras clínicas, incluindo soro, sangue e tecidos. Com o uso de cerca de dois milhões de sondas, o sistema compara genomas virais presentes nas amostras com uma biblioteca de sequências genéticas que abrange todos os vírus conhecidos de vertebrados. “Apenas se um vírus for totalmente novo, com mais de 60% do seu genoma diferente dos patógenos conhecidos, ele não será detectado por esse método. Na minha carreira, isso só aconteceu duas vezes. Portanto, acho que esse sistema nos deixa mais preparados para os próximos surtos”, afirmou.

Para avançar na detecção dos patógenos desconhecidos, o epidemiologista participa de um projeto que busca mapear todos os vírus presentes em animais no mundo. A estimativa é de que mais de 300 mil vírus possam ser descobertos dessa forma. O custo para identificar esses novos patógenos é alto: cerca US$ 6 bilhões. O valor alto é relativizado pelo cientista. “No caso da SARS, gastamos mais do que isso em apenas uma doença emergente”, comentou Lipkin. Segundo o cientista, conhecer os vírus animais deve facilitar a adoção de medidas capazes de prevenir epidemias. “Vamos supor que uma doença seja detectada pela primeira vez em humanos. Poderíamos não estar perto de ter uma vacina, mas saberíamos com qual patógeno o novo vírus se parece, como ele pode ser transmitido ou que animais podem ser seus reservatórios. Isso nos permitiria buscar formas para evitar o contato com esses animais e a disseminação da doença, o que é muito útil para prevenir surtos”, declarou.

Reportagem: Maíra Menezes
Edição: Raquel Aguiar
10/11/2016
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